Governança corporativa robusta é parte do caminho; a outra é punição severa aos envolvidos
Por Steven R. Peikin
Governança corporativa robusta, conselhos diligentes e auditores experientes são fundamentais para proteger companhias contra fraudes. Mas, sozinhos, não conseguem preveni-las, como frequentemente destacado por especialistas, incluindo Jay Clayton, meu colega e ex-presidente da SEC (a Comissão de Valores Mobiliários dos EUA).
Práticas sólidas de governança corporativa — como aquelas que nosso time de especialistas, incluindo um ex-presidente e um ex-diretor da SEC, encontraram na Americanas — podem reduzir significativamente a ocorrência de fraudes. No entanto, se executivos com conhecimento interno das práticas e controles da empresa estiverem determinados a cometer e ocultar suas ações, será quase impossível detê-los.
As investigações sobre a fraude na Americanas estão sendo conduzidas por três entidades públicas diferentes — a Polícia Federal, o Ministério Público Federal e a Comissão de Valores Mobiliários. Além disso, houve um comitê independente formado pela empresa e composto por profissionais altamente respeitados.
Suas conclusões até agora indicam que os antigos diretores não apenas coordenaram a fraude, mas também participaram dela pessoalmente, obtendo benefícios diretos. Tanto as autoridades públicas quanto o comitê independente encontraram evidências abundantes de um esforço abrangente desses executivos para ocultar a verdadeira condição financeira da Americanas de seu Conselho de Administração, dos auditores externos e do mercado.
Sinais de alerta
Conhecedores dos controles internos da empresa, eles sabiam como contorná-los. Por isso, não houve “sinais de alerta”. De fato, eles criaram dois conjuntos de contas — um para o Conselho, os auditores e o mercado em geral, e outro exclusivamente para eles, que registrava a verdadeira extensão de sua desonestidade.

Não é razoável esperar que qualquer Conselho de Administração, mesmo aplicando-se os mais altos padrões internacionais de governança, detectasse ou prevenisse uma fraude tão sofisticada. A Americanas tinha todas as estruturas corretas: um comitê de auditoria bem estruturado, os processos adequados de auditoria interna, uma firma de auditoria independente e renomada, controles internos apropriados e um canal confiável e seguro para denúncias. E todos funcionavam normalmente.
Não havia suspeita
Mas quando informações fabricadas, sem incongruências visíveis, são repetidamente apresentadas a um Conselho de Administração por fontes aparentemente confiáveis, o que haveria para suspeitar? Mesmo um Conselho diligente pode ser enganado quando uma equipe coordenada de diretores se dedica a mascarar controles, dados de supervisão e relatórios.
Nos Estados Unidos, sofremos o impacto de grandes fraudes contábeis no início dos anos 2000 — Enron, WorldCom, Adelphia, para citar algumas —, e tomamos medidas para ajudar a prevenir novas fraudes dessa magnitude. A Lei Sarbanes-Oxley, de 2002, não apenas estabeleceu regras mais rígidas, como também garantiu que os responsáveis — aqueles que conscientemente infringem a lei — sejam culpabilizados por seus crimes.
O episódio da Americanas pode ser um ponto de inflexão semelhante para o Brasil. Uma boa governança corporativa é apenas metade do caminho. Punir aqueles que cometem fraudes colocando o mercado de capitais, a economia e a saúde do sistema financeiro do Brasil em risco é fundamental. Pelo bem de todos — e especialmente dos milhares de funcionários de uma empresa como a Americanas, e suas famílias, que de um dia para o outro viram seus empregos à beira do colapso —, as lições de fraudes como esta devem ser aplicadas em novas regras que façam até os fraudadores mais sofisticados pensarem duas vezes.