Precisamos falar sobre o Simples Nacional
O regime tributário brasileiro é o pior dentre os países de renda média e alta. Além de termos uma carga tributária elevada em comparação com nações com desenvolvimento semelhante, somos os campões no ranking Doing Business, do Banco Mundial, no quesito “horas gastas para pagar impostos”. Este pódio nada mais é do que um troféu para a nossa ineficiência. Afinal, ao invés de usar essas horas para melhorar processos, inovar ou prospectar novos negócios, as empresas brasileiras perdem seu precioso tempo apenas neste escaninho da burocracia.
A disparidade é gritante: dispendemos 1.500 horas apenas para estar em conformidade com o fisco, enquanto os países membros da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) – entidade na qual o Brasil pretende ingressar, inclusive – gastam 158, os latino-americanos 370 e as nações do sudeste asiático, 273 horas.
Nesse cipoal da selva tributária onde vivemos, existe uma clareira que é o Simples Nacional. Por este sistema, as empresas pagam de forma simplificada um percentual fixo de seu faturamento para a maior parte dos impostos. A tabela é progressiva. Parte de uma alíquota de 6% para empresas com faturamento anual de até R$ 180 mil e chega a 33% para companhias com faturamento situado entre R$ 2,4 milhões e R$ 3,6 milhões por ano.
Esses valores foram instituídos pela Lei Geral da Micro e Pequena Empresa em 2006 e – inacreditavelmente – permanecem fixos desde então. A única mudança foi a criação da faixa com alíquota de 33%. Claramente, o que mantém as empresas no Simples Nacional é a facilidade no recolhimento dos impostos, pois, dependendo do tipo de companhia, outros regimes tributários sairiam mais em conta. Por essas e outras, o Simples precisa ser aperfeiçoado.
Em primeiro lugar, esses limites máximos de faturamento são bastante baixos. Nem precisamos ir longe para fazer esta constatação. Na nossa vizinhança mesmo há países muito mais amigáveis neste quesito. Chile e Colômbia, por exemplo, praticam um regime especial para pequenas empresas com faturamento de dezenas de milhões de reais por ano.
Além de serem baixos, os limites máximos estão muito defasados, uma vez que estão congelados há 15 anos. Desde 2006, a inflação ao consumidor medida pelo IPCA acumula mais de 140% de alta. Ou seja, se os valores fossem corrigidos, empresas com faturamento anual de R$ 421 mil poderiam estar no Simples pagando alíquota de 6%. E companhias que faturam até R$ 11,2 milhões por ano também poderiam se enquadrar neste modelo tributário.
Essa distorção espreme o limite de venda das empresas, inibindo-as de crescer. Ou as força a sair do regime simplificado. E quando o sistema não é simples, acreditem, ele é complexo demais.
Se olharmos o IGP-M, índice que mais se aproxima dos custos das matérias-primas industriais, o aumento da inflação nesses 15 anos foi de mais de 230%. Ou seja, dentro da realidade das indústrias, a alíquota de 6% deveria ser aplicada a empresas com faturamento anual de até R$ 583 mil e companhias que faturam R$ 15,5 milhões por ano também poderiam aderir ao sistema.
Com os limites atuais, quando chega o fim do ano, as empresas agem contra sua própria natureza: passam a recusar vendas para não serem penalizadas com a mudança de regime de tributação. Ou apelam para esquemas não ortodoxos de abertura de outras pessoas jurídicas em nomes de parentes só para dividir a conta.
E a penalização é alta. Se uma empresa em determinado ano atravessa o limite de faturamento do Simples, no ano seguinte ela perderá o direito de usá-lo. Porém, se teve um período extraordinário e o total de vendas em 12 meses ultrapassa em mais de 20% a faixa máxima, ela é automaticamente desenquadrada no mês seguinte e só pode retornar anos depois. O fato de ter rompido o teto em um mês não significa que isso se repetirá sempre. Em outros países há mais tolerância, e o fisco brasileiro também deveria ter.
Da mesma forma, é preciso também elevar com urgência os limites máximos de faturamento, criando categorias especiais para empresas industriais que lidam com matérias-primas mais custosas, além de reajustá-los anualmente e para que não fiquem defasados. O Simples Nacional é uma conquista importante, mas ele pode e deve ser aprimorado.
VANDERMIR FRANCESCONI JÚNIOR é primeiro diretor-secretário da Fiesp e do Ciesp