Imunidade do ITBI em integralização de capital para empresas imobiliárias
Por Leonardo Roesler
A imunidade tributária do ITBI nas operações de integralização de capital para empresas do setor imobiliário representa um dos temas mais complexos e sensíveis do Direito Tributário contemporâneo.
A discussão gira em torno da aplicação do inciso I do §2º do artigo 156 da Constituição, que concede imunidade na transmissão de bens e direitos incorporados ao patrimônio de pessoa jurídica para a realização de capital, com exceção nos casos em que a atividade preponderante da entidade seja a compra, venda, locação de bens imóveis ou arrendamento mercantil.
Essa análise é atualmente objeto de julgamento pelo Supremo Tribunal Federal, por meio do Recurso Extraordinário nº 1.495.108, inscrito sob o Tema 1.348 de Repercussão Geral, cuja decisão terá implicações profundas para o mercado imobiliário e para a incidência do ITBI em todo o país.
A Constituição, ao atribuir aos municípios a competência para instituir o ITBI, estabelece limites a essa competência por meio de imunidades tributárias. No §2º, inciso I, do artigo 156, protege-se a integralização de capital de pessoas jurídicas quando realizada com a transferência de bens imóveis, sendo que essa imunidade tem o propósito de incentivar a formação de novas empresas e a capitalização de sociedades existentes.
Dessa forma, busca-se desonerar o ingresso de bens no patrimônio de pessoas jurídicas em fase de formação ou expansão. Tal disposição atende a uma política de fomento ao desenvolvimento econômico e social, reconhecendo o impacto positivo que uma estrutura de capital robusta pode ter sobre a competitividade e a geração de empregos.
Contudo, a redação constitucional visa também evitar que essa imunidade seja utilizada como instrumento para atividades de compra e venda de imóveis sem incidência tributária, quando estas configurariam operações comerciais regulares sujeitas à tributação.
Interpretação dos contribuintes e jurisprudência sobre tema
O debate jurídico recai especialmente sobre a extensão dessa imunidade em casos em que a atividade principal da empresa beneficiária seja o setor imobiliário, envolvendo operações de compra, venda, locação e arrendamento de imóveis.
Contribuintes argumentam que a imunidade estabelecida pelo artigo 156, §2º, inciso I, é ampla e incondicional no que se refere à integralização de capital, abrangendo qualquer pessoa jurídica, independentemente de seu objeto social, desde que o ato jurídico caracterize uma efetiva integralização de capital, afastando-se, portanto, de operações comerciais ou especulativas.Essa interpretação, fundamentada na literalidade da norma, defende que a imunidade conferida é uma garantia constitucional de alcance abrangente, que não deveria ser limitada por interpretações restritivas. Como norma de imunidade constitucional, entende-se que o dispositivo teria aplicabilidade imediata, vinculando diretamente os municípios.
A jurisprudência do STF sobre o tema teve um desenvolvimento importante com o julgamento do Tema 796 da Repercussão Geral, no RE nº 796.376/SC. Nesse precedente, o STF firmou o entendimento de que a imunidade abrange o valor dos bens imóveis transferidos para integralização de capital social até o limite do capital subscrito pela pessoa jurídica.
Com essa decisão, o tribunal delimitou a aplicação da imunidade do ITBI para proteger a integralização de capital com bens imóveis dentro dos valores que correspondem ao capital social subscrito, permitindo a incidência do imposto sobre eventuais valores que excedam esse limite. Esse posicionamento clarifica a aplicação da imunidade constitucional do ITBI ao reconhecer que a proteção se restringe à transferência de bens que se destinem exclusivamente ao pagamento do capital subscrito, e não a qualquer valor adicional que possa configurar uma vantagem patrimonial.
Expectativa
O julgamento do Tema 1.348 pelo STF é aguardado com grande expectativa pelo setor tributário e empresarial, dado o seu potencial para pacificar a interpretação da imunidade do ITBI em operações de integralização de capital para empresas imobiliárias. Esse julgamento esclarecerá se empresas com atividade principal de exploração econômica de imóveis, como a compra e venda, podem ou não gozar dessa imunidade ao transferirem bens para o capital social, oferecendo respostas sobre a incidência do ITBI quando a atividade preponderante da empresa inclui operações imobiliárias.
A decisão terá, portanto, grande impacto na uniformização do tratamento dado ao ITBI nos municípios brasileiros, onde é comum uma interpretação restritiva que leva ao questionamento judicial da imunidade.
Para os contribuintes, a expectativa é que o STF opte por uma interpretação que reconheça a amplitude da imunidade do ITBI, assegurando que a transferência de bens para integralização de capital, quando destinada à formação de capital social, seja resguardada pela norma constitucional, independentemente da atividade principal da pessoa jurídica.
Essa visão evitaria que a integralização de capital com bens imóveis fosse tributada de forma generalizada, conferindo maior segurança jurídica ao ambiente de negócios e alinhando-se à política de incentivo à capitalização empresarial. Por outro lado, a interpretação municipal, que se posiciona de maneira restritiva, representa um ônus tributário adicional para empresas do setor, além de fomentar um alto índice de litigiosidade.Esse julgamento será decisivo para fornecer uma interpretação constitucional consolidada sobre a imunidade do ITBI, trazendo maior previsibilidade e coerência para o ordenamento tributário, além de reduzir a judicialização do tema em âmbito local.
A delimitação clara dessa imunidade é essencial para o mercado imobiliário e para outros setores que utilizam imóveis como parte de seu capital social, pois uma interpretação que valorize a ampla proteção constitucional contribuirá para a segurança jurídica das operações empresariais. Ao posicionar-se sobre o alcance da imunidade, o STF terá a oportunidade de reafirmar o compromisso da Constituição com o desenvolvimento econômico, preservando instrumentos que facilitam a criação e o fortalecimento de empresas, essenciais para um cenário econômico competitivo e sustentável.