Isabella Magano
Sócia do Pipek Advogados
O Brasil vive um processo de intensa polarização política, impactando não apenas o cenário eleitoral, mas também as relações sociais, profissionais e a convivência democrática, levando até ao rompimento de relações familiares.
Essa polarização também reflete no ambiente de trabalho. Diante desse contexto, o número de denúncias de assédio moral no trabalho cresce a cada eleição, criando um clima de medo e desconfiança no ambiente corporativo. Além de prejudicar as relações entre os colegas, afeta diretamente a produtividade das empresas, exigindo um posicionamento célere e efetivo das companhias.
O segundo turno em capitais como São Paulo, Porto Alegre, Belo Horizonte e Curitiba deve ampliar ainda mais o assédio eleitoral, caracterizado pelo abuso do poder diretivo do empregador com a finalidade de pressionar, coagir, orientar, discriminar, ameaçar ou intimidar seus empregados para influenciar a sua opinião política ou o seu voto. A prática pode se dar de maneira explícita ou velada, tanto antes, durante ou após as eleições.
A legislação veda a discriminação dos empregados em razão de suas opiniões políticas. A liderança tampouco pode interferir, influenciar, pressionar ou constranger empregados, direta ou indiretamente, a engajar em determinada atividade política, compartilhar qualquer orientação política ou apoiar determinado candidato. As boas práticas determinam que os líderes não compartilhem suas opiniões políticas no ambiente de trabalho.
Entretanto, a realidade mostra-se bem diferente, o que se pode constatar da jurisprudência trabalhista. Levantamento feito com a ferramenta de jurimetria Inspira AI indica cerca de 170 decisões de tribunais trabalhistas envolvendo o tema assédio eleitoral nos últimos dois anos, enquanto nos dois anos anteriores, foram apenas 7.
Não há dúvidas de que o país vive processo de agravamento da polarização política. A pesquisa global Edelman Trust Barometer, realizada com mais de 30 mil pessoas em 28 países, apontou que 78% dos brasileiros consideram que o país está mais dividido ideologicamente do que no passado, percentual superior ao registrado em países como Estados Unidos, Argentina e Itália. Outro dado que chama atenção é que apenas 29% estariam dispostos a ajudar alguém que pensa diferente.
Nesse cenário, o crescimento de episódios de assédio eleitoral é reflexo direto da sociedade polarizada. Dentre as situações mais comuns de assédio eleitoral, verificadas em ações trabalhistas, estão a não contratação de empregados em razão de sua orientação política, a realização de campanhas políticas internas em empresas, o uso de material de campanha política e emblemas partidários em uniformes, broches, cartazes, panfletos e outros materiais, e o incentivo à participação em manifestações políticas.
Caso o assédio seja constatado, tanto o empregado, quanto a empresa, podem sofrer punições severas. Ao empregado podem ser aplicadas desde penalidades disciplinares até desligamento por justa causa. O profissional também pode ser responsabilizado, em ação trabalhista, por danos morais em razão da prática de assédio eleitoral, assim como na esfera criminal, caso a conduta também tipifique crime eleitoral.
A empresa, por sua vez, poderá ser responsabilizada na esfera trabalhista, em ações individuais ou coletivas, com condenações em danos morais coletivos ou individuais, além de obrigações de fazer e não fazer. E também está sujeita a punições na esfera criminal, caso a conduta configure crime eleitoral.
Diante dessa conjuntura, as empresas precisam se estruturar para endereçar o tema. É preciso elaborar políticas internas para tratar do assunto, a fim de coibir qualquer forma de pressão, coação, discriminação ou constrangimento a trabalhadores no que diz respeito aos temas eleitorais. Os empregados, especialmente as lideranças, devem ser capacitados no assunto. Além disso, é fundamental instituir canais específicos para receber denúncias sobre o tema, garantindo a imparcialidade das apurações, o anonimato, confidencialidade e não retaliação.
As políticas empresariais devem deixar claros os limites de atuação de empregados no ambiente de trabalho em período eleitoral e orientá-los sobre os padrões de comportamento esperados, de forma a se exigir o respeito mútuo, se preservar as liberdades e garantias individuais e se evitar conflitos políticos no local de trabalho. Afinal, o voto é um direito constitucional e a escolha do candidato é a garantia de uma democracia plena e efetiva.
Isabella Magano
Sócia do Pipek Advogados