“Sistema tributário é complexo, disfuncional e injusto”, diz Mansueto
Considerada uma das determinantes do potencial de crescimento do Brasil nos próximos anos, a reforma tributária deve prosseguir em pauta este ano, mesmo com a pandemia do novo coronavírus. Segundo o secretário do Tesouro Nacional, Mansueto Almeida, o Governo deve enviar sua proposta própria até agosto.
O cearense admite que o Governo Federal está um pouco atrasado, tendo em vista a expectativa de que a proposição fosse enviada ao Congresso ainda no ano passado. “Mas estão trabalhando em uma nova proposta que deve ser enviada até agosto, considerando as contribuições dos Estados sobre a versão defendida pelo deputado Baleia Rossi”, afirmou Mansueto durante o Seminário de Gestores Públicos Prefeitos Ceará 2020, em painel virtual sobre finanças na tarde de ontem (23).
O titular do Tesouro categorizou o atual sistema tributário brasileiro como complexo, disfuncional e injusto. “O Imposto de Renda, por exemplo, não depende da renda, mas do tipo de contrato de trabalho. Os profissionais liberais pagam menos imposto por simplesmente usarem um tipo de contrato de trabalho que não deveria existir”.
Ele ainda afirmou ser contra a “pejotização”, mas ressaltou que não tem a intenção de criminalizar a prática, uma vez que as regras vigentes permitem. “Temos que ter a maturidade de discutir a regra e não permitir que haja carga tributária menor pelo contrato de trabalho. É importante reformular. Não será fácil mexer no sistema, mas o debate precisa ser posto”, defendeu.
Segurança jurídica
Mansueto ainda lembrou que as constantes mudanças nas regras tributárias costumam atrapalhar mais que a própria falta de infraestrutura do País, de mão-de-obra qualificada e outros gargalos, pois atrapalha o planejamento do investidor, que costuma ser de longo prazo. “Uma vez eu perguntei para um grande investidor o que mais dificulta o negócio dele. Ele me disse que qualidade da mão-de-obra e a falta de infraestrutura ele embute no preço do produto, por isso no Brasil é mais caro que em outros países. O que ele não consegue controlar são mudanças na legislação tributária. O investidor faz um planejamento de 20 anos, se muda as regras nesse meio tempo, atrapalha todo o planejamento”.
Ele cobrou regras mais claras e estáveis e acrescentou que parte da insegurança jurídica decorre de mudanças constantes nas regras, o que permite levar ao contencioso ou judiciário.
Discussão
Por propor mudança na tributação da origem para o destino, a reforma poderá reduzir drasticamente a arrecadação de alguns estados, gerando um fator de resistência. Um dos mais atingidos seria São Paulo, que arrecada cerca de 30% do que é produzido no Brasil. Mas beneficiaria estados consumidores de produtos fabricados em outros estados, como o Ceará.
Sobre a dificuldade de aceitação da reforma, Mansueto apontou que é necessário deixar claro que a mudança é essencial para o crescimento dos próximos anos e que a resistência de São Paulo à discussão, por exemplo, já é menor que há cinco anos.
“O que temos que fazer quanto a isso é garantir que a mudança de tributação da origem para o destino seja gradual, que haja um tempo para essa adaptação. Isso é o que está na PEC 45. Parte dos nossos problemas decorre do fato de as pessoas não entenderem os benefícios da reforma ou o custo de não fazê-la”, ressaltou Mansueto.
Apesar das dificuldades, o secretário aposta no diálogo para que o projeto seja continuado e comparou a situação com a aprovação da reforma da Previdência. “No primeiro ano de Governo, sem base política, conseguimos aprovar a reforma da Previdência por convencermos que ela era necessária. Nem o Macron, na França, que possui a base do Governo conseguiu aprovar. Precisamos debater, respeitando o contraditório, para conseguir enxergar os consensos, avançar e aprovar a reforma”, argumentou.
Orçamento
Outro âmbito que precisa ser revisto, segundo Mansueto, é a definição do orçamento. “O Brasil é o único País que conheço que manda orçamento para o Congresso com 94% dele já vai decidido onde vai ser alocado. O Congresso passa meses discutindo o que vai ser feito com 6% dos recursos apenas, porque o resto já é pré-definido. É até um desrespeito com Congresso”, ponderou.
Ele ainda criticou a nivelação de tratamento entre municípios quanto aos gastos públicos. “Pacajus é tratada de forma igual a Caxias do Sul, por exemplo. Todos têm que gastar o mesmo percentual da receita em educação e saúde. Se um deles tem uma proporção de idosos maior e quer gastar mais em saúde, não pode. É um engessamento que prejudica”, aponta.
Corporativismo
Ainda no mesmo painel, a secretária da Fazenda do Estado, Fernanda Pacobahyba, comentou que a pandemia está sendo um período propício para a reflexão de alguns pontos, como a atuação do serviço público e sua produtividade. “A palavra corporativismo tem sido mau usada ultimamente. O espírito de corpo se faz necessário, quanto mais isso for institucionalizado, mais sedimenta os valores, mais cristaliza as metas, que precisam ser as mesmas metas do público atingindo”.
Ela acrescenta que o corporativismo saudável, que visa atingir o interesse público é bem-vindo. “A sociedade não aceita mais um serviço público que olha só para o próprio umbigo, que dá a resposta que ele acha adequada sem levar em consideração o que população precisa. Precisamos nos reinventar”, afirmou.
Empresas digitais terão mais sucesso
A pandemia poderá trazer mudanças permanentes no mercado empresarial cearense e deverá favorecer empresas já imersas em plataformas digitais. Já os modelos mais tradicionais, como o comércio varejista deverá ser um dos setores mais impactados negativamente no Estado. A perspectiva foi apresentada por Flávio Ataliba, secretário executivo de Planejamento, Orçamento e Gestão do Governo do Ceará durante o Seminário de Gestores Públicos: Prefeitos Ceará 2020.
Segundo Ataliba, a economia sofrerá um impacto direto causado pelo encurtamento das cadeias produtivas locais e a adaptação do comportamento do consumidor no mundo pós-pandemia do novo coronavírus. O cenário fez o Estado identificar três grupos de empresas que poderão ter mais sucesso após a crise ou não.
No primeiro grupo estão as empresas que já estão inseridas no mundo digital, tanto os negócios de tecnologia, comunicação ou até mesmo aquelas focadas no comércio digital, uma vez que, segundo ele, o fluxo de mercadorias também será atualizado.
Contudo, ele afirmou que o comércio varejista será o setor mais prejudicado pela crise, por depender de grandes níveis de aglomeração. O fato gera preocupações do Estado, já que o Produto Interno Bruto (PIB) do Ceará é composto majoritariamente pelos setores de serviços e comércio. Em um grupo intermediário, Ataliba cita as instituições financeiras.
Já o secretário Maia Júnior, de Desenvolvimento Econômico e Trabalho do Estado, afirmou que a Sedet já enviou ao governador Camilo Santana dois projetos focados em apoiar micros e pequenas empresas no Ceará. Os projetos deverão estar focados em clusters de inovação. “É uma parceria com o Sebrae, a Aprece e a Fecomércio, que vai envolver mais de 2 mil empresas para testar essa nova realidade”, disse.
Fonte: Diário do Nordeste