Especialistas aprovam solução de pontos polêmicos da lei de arbitragem
Após ameaça de retrocesso, o texto da nova lei arbitral acabou repercutindo bem. Especialistas do ramo dizem que o texto recém-aprovado pelo Senado consolida a jurisprudência dos tribunais e ainda acaba com eventuais divergências.
O ponto mais criticado era uma emenda, proposta pela Câmara dos Deputados, que dificultava a arbitragem em contratos públicos. Mas na noite da última terça-feira, o Senado excluiu a alteração.
“A emenda condicionava a arbitragem a uma regulamentação que seria feita no futuro”, comenta o advogado do L.O. Baptista-SVMFA, Paulo Macedo. Como não havia qualquer previsão para que essa regra fosse publicada, a expectativa era de que a arbitragem poderia ficar travada por um intervalo de tempo indeterminado.
Além disso, a modificação proposta pela Câmara exigia que o edital público fizesse previsão do processo arbitral. Isso seria outro obstáculo para a resolução dos conflitos pelo meio extrajudicial. “A condição limitaria muito a arbitragem”, destaca ele.
A alteração do projeto nesse sentido também iria contra a jurisprudência já firmada no Superior Tribunal de Justiça (STJ), que já reconhecia o uso da via arbitral mesmo quando o edital do projeto não previa o mecanismo.
O ministro do STJ, Luis Felipe Salomão – padrinho do texto da nova lei de arbitragem – inclusive fez visita a Renan Calheiros, presidente do Senado, em março. Ele argumentou para que fosse rejeitada a alteração da Câmara.
Com a exclusão da emenda, considerada um retrocesso, os advogados avaliaram que no geral o texto da nova lei arbitral traz pontos positivos. “A base dessa reforma é tudo o que a jurisprudência, nesses 18 anos de arbitragem, estabeleceu”, diz a advogada Selma Lemes, que participou da criação da primeira Lei de Arbitragem (9.307/1996), vigente até a sanção da nova legislação.
O sócio responsável pela área de arbitragem do TozziniFreire Advogados, Fernando Eduardo Serec, acrescenta que num primeiro momento havia receio sobre mudanças na lei. “Não era uma lei que precisaria ser modificada. A comissão [que criou o novo texto] foi muito bem ao adotar aquilo que já estava funcionando. Não mudando o que não precisava ser mudado”, conta ele.
Mas além de não descartar as regras arbitrais construídas desde 1996, o projeto ainda trouxe alguns avanços. Exemplo disso seria a criação da chamada carta arbitral, ferramenta jurídica com a qual o árbitro consegue auxílio do juiz para forçar o cumprimento de uma sentença.
Outro exemplo, diz Macedo, diz respeito à obtenção de liminares na Justiça. Antes, poderia haver questionamento se uma das partes ia ao Judiciário para fazer o pedido cautelar, como medida de urgência, antes da formação do procedimento arbitral. Mas agora, fica mais claro que é válido recorrer ao juiz para pedir a liminar.
“Se uma empresa está beirando a falência e o credor tivesse que esperar até o começo do processo arbitral para conseguir bloqueio de bens, esses bens já não estariam mais lá”, aponta ele.
Tribunal de contas
Outro problema que deve se resolver com a nova lei é relacionado à atuação dos tribunais de contas, comenta Serec. “Existia decisão – uma bobagem – com o entendimento de que a arbitragem não deveria ser usada para discutir aspectos econômicos, por exemplo, de contratos de concessão. Isso é um contrassenso absoluto”, comenta o advogado.
Na visão do especialista, essa separação de quais são os objetos válidos das decisões do procedimento arbitral, com a nova lei, deve cessar.
Para Selma Lemes, outro avanço foi que a nova lei exclui o artigo 25 da legislação de 1996. Segunda ela, o trecho dizia que se no decorrer da arbitragem surgisse uma questão de direito indisponível (direitos do qual não se pode abrir mão), o árbitro poderia enviar a questão à Justiça.
“A lei já era clara. Dizia que quem poderia fazer isso era o árbitro”, acrescenta. Mas em caso recente, envolvendo a Petrobras, um juiz teria atendido pedido da Agência Nacional de Petróleo (ANP) e suspendeu a arbitragem com base nesse artigo. “Era um artigo pouco usado e que não contribuía para a arbitragem. Mas [agora] essa confusão não vai mais existir”, comenta ela.
Ponto em aberto
Para Selma, o único defeito da lei é que as arbitragens envolvendo a administração pública ficam restritas às questões “de direito”, e não de “direito e equidade”, como trazia a legislação anterior. Com isso, ela diz que fica em cheque a adoção de regras e costumes internacionais nos processos de arbitragem. Seriam apenas válidas as regras de direito.
“Há segmentos que trabalham com normativas internacionais. Não existem leis. São casos como os da Petrobras, do Banco do Brasil. As regras são reguladas pela comunidade internacional. Como fica a situação desses negócios se a lei não permite? Não sei. Quem vai definir é judiciário”, diz ela.
Numa comparação, Selma afirma que a arbitragem é um sistema com cabeça, tronco e membros. E sem o princípio da equidade, perde-se o equilíbrio. “Se você tira um braço, a arbitragem fica desequilibrada. Nesse ponto, era melhor não ter dito nada, para que ficasse com a regra anterior”, completa a especialista.
DCI – SP