Empresas brasileiras tiveram que se organizar em função de um sistema distorcido, afirma Appy
Como lidar com a situação do Brasil, país em que um sistema de tributação do consumo totalmente distorcido fez com que as empresas se organizassem em função dessa distorção e em que a distribuição da receita entre estados e municípios também é resultado dessa realidade? Em palestra realizada nesta sexta-feira (1º/12), durante evento no Rio de Janeiro, o secretário extraordinário da Reforma Tributária do Ministério da Fazenda, Bernard Appy, afirmou que essa era – e continua sendo – a principal questão do processo de migração do país para as novas regras de tributação do consumo.
“O grande ponto do Brasil não era decidir sobre onde queria chegar. Isso era fácil saber: o melhor padrão internacional”, afirmou o secretário na 60ª Convenção de Contabilidade do Estado do Rio de Janeiro (Concerj). “Não estamos inventando uma coisa totalmente nova. Estamos trazendo para o Brasil aquilo que o resto do mundo já faz em termos de tributação do consumo.”
“Pior sistema do mundo”
A transformação daquele que, nas palavras do secretário, é o “pior sistema de tributação do consumo do mundo” em um sistema moderno, alinhado às melhores práticas internacionais, envolve soluções como o Imposto sobre Valor Adicionado (IVA) dual e dois modelos de transição (para a substituição dos tributos e para a colocação em prática das novas regras de distribuição de receita entre os entes federados), equacionamentos de natureza técnica e política propostos pelo Congresso Nacional com apoio do Ministério da Fazenda e explicitados na Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 45/2019.
Aprovada na Câmara dos Deputados em julho e no Senado em novembro, a PEC 45/2019 retornou à Câmara, onde agora passa por análise das alterações feitas pelos senadores. Appy enfatizou: “Os melhores IVAs do mundo têm apenas uma alíquota positiva. O mais simples possível, uma regra só para todo mundo. Esse era o modelo original da PEC 45. Na tramitação no Congresso Nacional, acabaram tendo algumas exceções. Várias exceções, na verdade. O ideal era ter uma regra só. Do ponto de vista técnico, não ter exceções. O fato é que nós estamos saindo de um sistema completamente distorcido para um sistema que tenta se aproximar do melhor padrão internacional. Muito difícil fazer essa transição e simplesmente chegar em um sistema em que vai ser uma alíquota só para tudo.”
Simplificação
Appy explicou que as exceções são de duas naturezas: alíquota reduzida (40% da alíquota padrão), destinada a setores como saúde, educação e a cadeia do agro, e regimes específicos, que é uma forma diferenciada de cobrar o imposto. Uma parte dos regimes específicos é de natureza técnica, como os referentes a serviços financeiros, operações com bens imóveis e combustíveis; outra parte tem razões políticas, como a que inclui bares, restaurantes, hotéis e agências de turismo. Na esfera das alíquotas reduzidas foi criada, no Senado Federal, uma categoria intermediária, em que alíquota será de 70% da alíquota padrão e que abrange profissões regulamentadas.
“Perto do que nós temos hoje, o sistema vai ser muito mais simples”, disse Appy, ressaltando que, além do fato de que o novo sistema terá muito menos exceções do que hoje, permitirá a redução da complexidade e do litígio e o fim das distorções na forma de organização da economia, que impedem o país de ser mais competitivo.
Sobre as exigências trazidas pela reforma para as empresas, Appy explicou que, com o Comitê Gestor, instância técnica cuja criação está prevista na PEC 45/2019, haverá uma interpretação única da legislação dos novos tributos – a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), o IVA federal, e o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), de estados e municípios. Ao se dirigir aos contadores presentes ao evento, Appy comentou que um aprendizado será necessário, mas no contexto de uma realidade tributária mais simples, moderna e eficiente.
Tramitação
Também nesta sexta-feira, no Rio de Janeiro, Appy fez palestra na PwC, empresa que atua na prestação de serviços integrados nas áreas de auditoria e asseguração, consultoria tributária, consultoria estratégica e assessoria em transações. O secretário falou do momento da tramitação da PEC 45/2019 no Congresso Nacional – e da expectativa de promulgação da emenda constitucional ainda em 2023 –, analisou os principais problemas do atual sistema de tributação do consumo e projetou a nova realidade que será vivenciada pelo país a partir da promulgação da reforma.
O sistema de compensação de débitos e créditos, ainda em fase de especificação, foi um dos pontos abordados. “O fornecedor só vai ter crédito se tiver pago o fornecedor dele”, disse o secretário sobre uma das premissas do novo modelo. A escrituração pré-preenchida foi destacada pelo secretário como uma das ferramentas estudadas para simplificar o processo de pagamento dos impostos.
A recuperação rápida dos créditos tributários resultantes de investimentos e o caráter extrafiscal do Imposto Seletivo (IS), que incidirá sobre produtos nocivos à saúde e ao meio ambiente, também receberam atenção especial do secretário em sua exposição. O IS, embora seja um imposto federal, terá 60% de sua arrecadação destinada a estados e municípios.
Fonte: Agência Brasil