Trabalho terá mais risco, mas será mais livre
O trabalhador arquetípico em uma economia avançada costumava ser um operário de linha de produção ou um assalariado em um escritório — uma pecinha, segura mas reprimida, da engrenagem.
“Uma multidão fluía pela ponte de Londres, tanta gente/ Nunca imaginei que a morte tivesse aniquilado a tantos”, escreveu T. S. Eliot, por muito tempo funcionário do Lloyds Bank, em “The Wasteland”.
Continuam a existir milhões desses trabalhadores, entre os quais muitas mulheres, mas o novo mundo do trabalho é tanto mais empolgante quanto menos seguro. Existe maior variedade de pagamento e condições.
É mais provável que o trabalho seja de tempo parcial, temporário, free-lancer, ou autônomo. E pode bem nem ser um emprego de maneira alguma, pelo menos na forma pela qual um emprego costumava ser definido.
A “economia do frila”, o crescimento de plataformas online como o Airbnb e o Uber, por meio das quais as pessoas compram e vendem serviços e trabalhos, é só uma parte da mudança que o emprego vem sofrendo nas três últimas décadas, impulsionada pela tecnologia e pelo avanço no comércio mundial.
Essa mudança criou muitos ganhadores e perdedores, ao terceirizar empregos do Ocidente para a Ásia e a África e ao alterar os termos sob os quais a maioria trabalha.
O risco financeiro e contratual com o qual as empresas costumavam arcar foi transferido aos empregados.
A era de um emprego para a vida toda, e a segurança econômica que ele propiciava, está em crise. Mas esse mundo de insegurança e risco também é um mundo que muita gente parece apreciar.
Nos EUA e na Europa, a proporção dos profissionais autônomos que afirmam apreciar seu trabalho é superior à dos empregados. Muitos desses empreendedores gostam da liberdade e da autonomia, bem como da possibilidade de enriquecer.
Existe muito potencial nesse novo mundo. O McKinsey Global Institute estima que as “plataformas de talento on-line” podem elevar em 2% o PIB mundial, até 2025, aumentando o total de pessoas empregadas pelo equivalente a 72 milhões de trabalhadores de tempo integral.
O Reino Unido viu surgirem 1,4 milhão de “microempresas”, com entre 0 e 9 empregados, de 2000 para cá. A União dos Free-lancers dos EUA estima que 53 milhões de americanos façam trabalho free-lancer, entre os quais há 21 milhões de prestadores de serviços independentes.
O desafio para as autoridades econômicas é encontrar uma nova forma de contrato que se adapte às mudanças na força de trabalho. Benefícios como pensões e licenças médicas eram condicionados ao emprego permanente, e aumentavam com a longevidade no posto.
À medida que o emprego se fratura, as pessoas que trabalham como consultores ou operam “microempresas” precisarão de algum tipo de apoio semelhante.
Já existe movimento na área legal. O Comissário do Trabalho da Califórnia decidiu em julho que os motoristas do Uber eram para todos os efeitos empregados da companhia, e não prestadores de serviços independentes como a empresa os via.
O governo britânico está elevando o salário mínimo para trabalhadores adultos, e o Conselho Salarial do Estado de Nova York recomendou a adoção gradual de um salário mínimo de US$ 15 por hora para os trabalhadores do segmento de fast food.
Pouca gente quer ser uma pecinha na engrenagem, mesmo que essa oportunidade lhes seja oferecida.
O novo mundo do trabalho precisará encontrar o rumo certo em meio ao perigo duplo do conformismo empresarial e da exploração do trabalhador.
JOHN GAPPER – “FINANCIAL TIMES”, EM LONDRES