Sem perguntas certas
“…Sem perguntas certas, sem questionamento, não há ciência.” Craig Venter – revista “Veja”
E fica fácil, até mesmo simplista, extrapolar o parágrafo acima para o nosso dia-a-dia. Na escola, faculdade, na pós, no curso de corte e costura, de culinária, em qualquer situação de aprendizagem, se não fazemos perguntas, se não questionamos, não estamos, de fato, aprendendo. A questão do ensino-aprendizagem passa por uma onda compreensiva, um discurso de acolhimento, que muitas vezes reproduz a ideia de que quem aprende está ali como um sujeito, e não agente.
O grande dilema é que estes que estão passivos no processo de aquisição do conhecimento (que não perguntam nem a si mesmos o quanto aquilo que está sendo aprendido é correto, em que está baseado ou ainda qual a consequência que provocam) na verdade não estão adquirindo nada! Quando muito chegam aos trancos e barrancos ao final de um curso, recheados de informações, mas não de conhecimento.
E aí as coisas apertam. Acaba a história de sobreviver ao estágio com aquele ar de menino/menina que se dispõe a correr de um lado para o outro como se estivesse fazendo algo relevante. A realidade é dura, exigente e cobra! Cobra muito e o tempo todo. Cobra capacidades, habilidades e uma atitude madura, pró ativa, questionadora. E como crescer é um processo evolutivo, aquele sujeito do meio, da vida, das circunstâncias, se vê na condição de ter de ser seguro e carregado da condição de responder de forma pronta e consistente aquilo que agora faz parte da sua função.
Sob a ótica da funcionalidade, este sujeito-agente tem de dar conta de coisas para as quais nunca esteve pronto. Claro que tem alguém pensando “a vida se aprende na prática” e sai extrapolando este chavão para o mundo do trabalho. Ledo engano! Este profissional que aí está, sem preparo para o mundo da produtividade, inserido em um ambiente de alta competitividade, com metas definidas e prazos curtíssimos, tem que saber o que faz! E não sabe! E aprende da pior maneira possível, pois rapidamente aprende a fingir que sabe, além de passar a acreditar que sabe!
Senhor, livrai-nos da onipotência daqueles que fingem que sabem. Profissionais que sempre jogam sobre os outros os erros que cometem, que cobram qualquer coisa do primeiro que aparece pela frente, pelo simples prazer de provocar no outro a certeza de sua incapacidade, quando esta certeza se estrutura sobre uma projeção perversa.
E assim voltamos ao recorte da frase dita por Craig Venter: sem questionamento, não há ciência. Sem questionamento não há nada! Vira-se fantoche na mão de qualquer pessoa que, com um mínimo, um milionésimo de milímetro de mais conhecimento do que eu, passa a determinar meu destino profissional. E a aquisição do conhecimento começa muito cedo. Na história que ouço e que me leva a perguntar “por que”. Na história que continua sendo construída pela minha imaginação, que recheio e misturo com outras histórias que vou lendo. E na forma como aquela biblioteca de livros infantis foi sendo acrescida de romances, aventuras, biografias, livros técnicos, revistas interessantes, jornais sérios, uma pilha especial de coisas bobas que me fazem rir e sonhar.
Descobrir nossa capacidade de compreender e incorporar conhecimento é uma porta mágica, única, ali disponível para todos que quiserem abri-la.
– por Lise Steigleder Chaves, consultora em gestão de pessoas / artigo publicado no A Notícia