O auxílio home office e seus aspectos tributários
Por Leandro Vieira*
Não há dúvidas de que a pandemia da Covid-19 trouxe os mais variados impactos para a atividade empresarial, especialmente no tocante às relações trabalhistas. A necessidade de distanciamento social impôs aos empregadores e trabalhadores a adoção do trabalho remoto (home office) e, embora os dados atuais demonstrem o breve retorno da normalidade, a nova realidade das relações trabalhistas certamente continuará marcada pelo trabalho a distância.
No entanto, alguns aspectos devem ser bem avaliados em relação a essa modalidade de trabalho, sobretudo os de natureza tributária, de modo a evitar que os valores pagos pelo empregador ao trabalhador a título de ajuda de custo para o home office (internet, energia elétrica, equipamentos, suprimentos etc.) não adquiram a natureza de remuneração e, com isso, façam surgir para ambas as partes o dever de pagamento dos tributos pertinentes.
Nesse sentido, é sabido que a remuneração paga ao trabalhador pelo serviço prestado ao empregador está sujeita à incidência das chamadas contribuições previdenciárias (cota patronal, cota do empregado e risco ambiental do trabalho), bem como do imposto de renda devido pela pessoa física e sujeito à retenção e recolhimento pela fonte pagadora. Mas o que dizer dos valores pagos a título de ajuda de custo ao trabalhador? Estão igualmente sujeitos à incidência daqueles tributos?
As contribuições previdenciárias tiveram as suas balizas definidas pelo art. 195 da Constituição Federal, que autorizou a sua cobrança sobre a folha de salários e demais rendimentos do trabalho pagos ou creditados, a qualquer título, pelo empregador à pessoa física que lhe preste serviço, mesmo sem vínculo empregatício. Portanto, do dispositivo constitucional já desponta o primeiro limite à exigência das contribuições: elas só podem onerar os valores pagos ao trabalhador como contraprestação ao serviço prestado, isto é, “pelo trabalho executado”, e não as quantias dadas “para o exercício do trabalho”, como é o caso das ajudas de custo.
Essa regra de não tributação pelas contribuições previdenciárias é reforçada pelo § 2º do art. 457 da CLT e pelo inciso ‘m’ do § 9º do art. 214 do Regulamento da Previdência Social (Decreto nº 3.048/99), pois, segundo esses dispositivos, as importâncias pagas a título de ajuda de custo, ainda que habituais, não integram a remuneração do empregado e, portanto, não constituem base de incidência de qualquer encargo trabalhista e previdenciário.
Por outro lado, o fato que desencadeia o dever de pagamento do imposto de renda pela pessoa física, nos termos do art. 43 do Código Tributário Nacional, é a aquisição da disponibilidade econômica ou jurídica (I) da renda, assim entendido o produto do capital, do trabalho ou da combinação de ambos e (II) de proventos de qualquer natureza, assim entendidos os acréscimos patrimoniais não compreendidos no inciso anterior. Em suma, o imposto onera toda e qualquer riqueza nova que aumente o patrimônio da pessoa física (a exemplo da renda proveniente do trabalho), não abarcando as indenizações destinadas à mera recomposição patrimonial, como também é o caso das ajudas de custo pagas ao trabalhador como ressarcimento de despesas.
Entretanto, como toda regra tem suas exceções, o empregador deve se manter atento para que as ajudas de custo relativas ao home office não sejam interpretadas como remuneração/renda pelo Fisco federal, com as consequências tributárias daí advindas. Isso porque nem a legislação das contribuições previdenciárias e nem a do imposto de renda definem com precisão e clareza o que é “ajuda de custo” e quais valores estão encampados por este conceito, mas é possível extrair da jurisprudência trabalhista
que a ajuda de custo desprovida de natureza salarial é somente aquela destinada a reembolsar/indenizar a despesa assumida pelo trabalhador e de responsabilidade do empregador, na exata proporção do gasto realizado e de sua efetiva comprovação.
Dessa forma, para evitar o risco de autuação pelo Fisco federal, alguns cuidados podem e devem ser adotados em relação ao ressarcimento de despesas ao trabalhador no regime de home office:
(I) é essencial que o empregador institua, por escrito, um regulamento para o pagamento da ajuda de custo e que este documento componha o contrato de trabalho firmado com o empregado;
(II) é indispensável a comprovação da despesa de forma exata e individualizada em relação ao seu valor, ou, na sua impossibilidade, quando menos por meio de laudos idôneos e bem embasados que comprovem o custo médio da despesa reembolsada; e,
(III) na hipótese em que não for possível individualizar e determinar o valor da despesa, recomenda-se que o valor pago ao trabalhador seja submetido à incidência das contribuições previdenciárias e do Imposto de Renda.
*Integrante da Comissão de Apoio Jurídico às Micro e Pequenas Empresas da OAB/MG