Ritmo menor da arrecadação pode afastar investidores
Especialistas alertam para a dependência da arrecadação de impostos no financiamento dos gastos públicos. Segundo levantamento do professor do MBA Gestão de Riscos da Trevisan Escola de Negócios, Claudio Gonçalves, desde 2008 o recolhimento de tributos federais não apresenta “picos” de crescimento.
“Com base em dados da Receita Federal, nos últimos 18 anos, a arrecadação cresceu acima de 10% [em comparação com o acumulado do ano anterior] nos anos de 1998 [para R$ 470,196 bilhões], 2002 [para R$ 624,526 bilhões] e 2004 [para R$ 674,727 bilhões]. Depois não vemos mais esses picos de expansão”, aponta.
Na opinião dele, a tendência, “se não houver uma mudança no arcabouço institucional da economia”, como rever os gastos públicos, é que arrecadação continue a crescer pouco, e a dívida bruta suba. “Este cenário pode afetar a decisão sobre os ratings [nota de risco] do Brasil”, alerta.
No acumulado do ano até setembro, a arrecadação federal somou R$ 806,446 bilhões, ligeira alta de 0,89% na comparação com o mesmo período do ano passado, descontada a inflação.
Segundo Gonçalves, o País caminha para um rebaixamento do rating em breve, isto porque a dependência dos gastos públicos com a arrecadação, que está desacelerando anualmente, pode aumentar a dívida bruta, algo avaliado pelos investidores. “Se o rating for reduzido, os primeiros a deixar de direcionar recursos para o Brasil serão os fundos de investimento e isso vai levar os demais a fazerem o mesmo. Se isso acontecer vai demorar a recuperar a confiança dos investidores”, avalia o professor.
Para o corresponsável de economia e estratégia para a América Latina do Barclays, Marcelo Salomon, a expectativa é de que no primeiro trimestre de 2014, as agências de classificação de risco rebaixam o rating brasileiro.
Os motivos seriam o intervencionismo em projetos – como pode ser notado pela fraca concorrência ao leilão de Libras, no pré-sal -, junto com uma deterioração da política fiscal – não irá cumprir a meta fiscal – e com um fraco crescimento econômico neste ano e nos próximos. Cenário este que levaria o governo federal a rever a política fiscal, na visão do especialista.
“O fato de o governo admitir que irá arrecadar menos que o previsto dá uma impressão perigosa aos investidores. Isto porque, ao mesmo tempo, o Impostômetro [placar eletrônico que mostra a arrecadação em todas as esferas públicas, e localizado do centro da capital paulista] sempre registra recordes de recolhimento dias antes do que foi no ano anterior”, analisa o economista da FIA, Carlos Honorato, ao explicar que a arrecadação de impostos cresce, mas o governo não consegue atingir o superávit primário sem uso de “contabilidades criativas”.
A previsão da maioria do mercado é que a economia para o pagamento dos juros da dívida pública não atinja a meta de 2% do Produto Interno Bruto (PIB) neste ano, com abatimentos de investimentos.
Na semana passada, o secretário adjunto Luiz Fernando Teixeira Nunes, admitiu que a Receita poderá reduzir a projeção de crescimento da arrecadação este ano. Atualmente, a previsão é 3%, mas, segundo ele poderá ficar entre 2,5% e 3%. Em 2012, a arrecadação somou R$ 1,099 trilhão.
Para Nunes, a mudança na estimativa deve-se às alterações em indicadores econômicos. Um deles é o crescimento da produção industrial, que passou de 3,12% em julho, para 2,02% em agosto e para 1,66% neste mês, na comparação com os mesmos períodos de 2012. O secretário também citou as vendas de bens e serviços, com queda de 1,95% em julho, crescimento de 3,7% em agosto e retração de 0,8% em setembro, no mesmo tipo de comparação.
Honorato sugere que a primeira ação do governo seria deixar clara a destinação do que a Receita arrecada, conselho este compartilhado pelos demais especialistas já entrevistados pelo DCI.
DESCULPAS
Porém, também na semana passada, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, afirmou que o Brasil tem um comportamento fiscal inquestionável. “As contas públicas estão sob controle e nossa dívida líquida está caindo.”
Segundo o ministro, em função da crise internacional e da política anticíclica adotada, em determinados períodos o resultado primário foi um pouco menor. “Mas ainda muito superior a outros países”, disse, em resposta ao estudo da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) que recomendou maior aperto fiscal.
DCI-SP