Relator admite incluir mudança no IR e desoneração da folha em reforma tributária da Câmara
O deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), relator da reforma tributária da Câmara, admite que pode incluir a redução nos impostos pagos pelas empresas sobre a folha de pagamentos e alterações no Imposto de Renda. Em entrevista ao Estado, o relator defende que a desoneração da folha poderá ter o efeito de aumentar os salários no País. Hoje, as empresas pagam 20% sobre a folha de pagamento.
Um dos caminhos seria fixar um comando constitucional para que as mudanças sejam feitas depois da aprovação da proposta de emenda à Constituição (PEC) por meio de projeto de lei. Modelo semelhante foi feito com alguns pontos da reforma da Previdência.
O relator, no entanto, afirma que o ambiente no Parlamento é de rejeição de um imposto nos moldes da antiga CPMF para bancar a desoneração, como quer o secretário da Receita Federal, Marcos Cintra.
O texto original da PEC 45, de autoria do deputado Baleia Rossi (MDB-SP), cria o Imposto sobre Bens e Serviços, unificando impostos, nas não trata de outras mudanças no sistema tributário. A desoneração dos salários e mudanças do IR são ideias que o governo também quer levar à frente, mas ainda não apresentou a proposta ao Congresso. Leia a entrevista a seguir.
O governo ainda não apresentou a sua proposta de reforma tributária. A Câmara vai avançar na votação?
Nosso papel é avançar. Temos um ambiente propício. Há um consenso de que nosso sistema precisa ser modificado urgentemente e isso já está atrasado nessa modificação. O presidente (da Câmara) Rodrigo Maia (DEM-RJ) nos liderou na Previdência e está comprometido com essa agenda. Apesar de estarmos vivendo esse momento político diferenciado, ele também nos permitiu ter um ambiente favorável às reformas. Outro ponto relevante é que os conceitos estão convergindo.
O que o senhor chama de conceitos?
Um sistema tributário que seja simples, transparente e justo.
Mas esses conceitos sempre estiveram presente, não?
A gente persegue isso, mas não tínhamos essa convergência. Hoje, não há clareza de quanto imposto se está pagando, no consumo. Mas o principal conceito é a cobrança do consumo no destino (ou seja, onde os produtos e serviços são comprados e não na origem, onde são produzidos). Agora nós temos a convergência.
O sr. pretende incluir mudanças no Imposto de Renda?
A comissão demonstrou a intenção de discutir as mudanças no IR e outros temas. Imposto de Renda não pode ser por PEC. Mas estou disposto a dialogar. Na comissão, já foi feita a provocação e vamos discutir.
Se não pode estar na PEC, com0 serão aprovadas medidas para o IR?
Depende do tipo de mudanças que vai fazer. Posso dar um comando na PEC para que se faça depois um projeto. Na reforma da Previdência, foi feito isso. Alguns temas foram feitos por comando constitucional geral para um projeto de lei complementar ou ordinário, dependendo do tema.
É necessário mudar o IR?
O governo já tinha dito que poderia mudar alíquota, inclusive desconto de despesas. Tudo isso estamos discutindo na comissão. Mas um tema desse ninguém vai discutir sem sentar com o governo.
E a desoneração da folha das empresas?
Também acho. Ela pode gerar emprego e a consolidação de salários. Aumentar, inclusive, o poder de salários. Em alguns países, ele não gerou tanto emprego, mas aumentou o nível de salários. Em outros países, ele até teve o condão de gerar emprego. Esse é o tema que já foi tratado na comissão.
A desoneração pode estar na sua proposta?
Pode, sim. A oneração da folha é cumulativa e onera o País como um todo. É um tema que se nós pudermos enfrentar, eu ficarei satisfeito.
A ex-presidente Dilma Rousseff tentou enfrentar e acabou gerando enorme custo fiscal sem sucesso. É possível conciliar?
Esse é um dos grandes desafios que teremos. O problema da desoneração é o impacto previdenciário. Vamos ter que criar uma alternativa para cobrir esse déficit. Como criar isso? Nós estamos estudando.
O ministério da Economia defende um tributo sobre transações, nos moldes da CPMF, para desonerar a folha?
Estamos com um desafio para as equipes técnicas que estão avaliando. Tem uma turma boa.
Existe a possibilidade de incluir a CPMF dentro da sua proposta?
Há um ambiente na Casa de rejeição a imposto como esse. Todo mundo que veio aqui nas audiências públicas é contrário.
Mas o setor de serviços quer a CPMF?
Não sei. Isso não é consenso no setor de serviços. Tem um caráter cumulativo (não possibilita um crédito para a empresa, sendo, portanto um imposto em cascata). Há uma rejeição até pelo histórico da CPMF. Acho que tudo está posto para ser discutido. Vamos ouvir. Esse momento é de estarmos pronto para dialogar. Essa é reforma do diálogo.
O secretário da Receita, Marcos Cintra, é um ferrenho defensor da CPMF. Ele capitaneia essa negociação?
Quem está capitaneando essa negociação é o ministro da Economia, Paulo Guedes.
Como a reforma do governo vai ser acoplada ao texto que já está na Câmara?
Não tenho como antecipar porque não sei o que o governo fará. Dependerá do que ele vai apresentar. Guedes me falou que está concluindo sua proposta. O que nos falou é que quer fazer uma discussão próxima do parlamento.
Mas já foi definido de que forma isso será feito? Pode ser por meio de emendas na Comissão Especial? Ou será um texto novo?
Colocar emendas não é iniciativa de governo. Iniciativa de governo é apresentar um projeto. Então, ou o governo terá ou não terá inciativa. Para tramitar na Casa, sendo uma proposta do governo, o presidente decide se apensa no mesmo projeto.
O governo tem como trazer a proposta dele por meio de um senador ?
Não, aí é não é uma iniciativa de governo, porque se for feito por um parlamentar, é uma iniciativa de um parlamentar. Então, para mim, não reconheço nisso uma iniciativa do governo. Inciativa do governo é o que o governo propõe. Uma iniciativa minha, por exemplo, posso até combinar com o governo, mas a iniciativa é minha, não é do governo.
A agenda da reforma é positiva, mas ao mesmo tempo ninguém quer sair perdendo.
É natural isso. Precisamos conciliar os interesses federativos e também o interesse setorial. Como fazer isso? Com muita conversa e diálogo. É uma reforma que tem uma diferença muito grande da previdenciária porque ela era, ao meu ver, plebiscitária, ou você era a favor ou contra. Agora, todo mundo é a favor, mas com a peculiaridade de “qual reforma”.
Com tantos projetos na praça não se corre o risco de a reforma morrer na praia?
Não, estamos focados. Sabemos o que queremos. Está todo mundo mobilizado. Quando há convergência, ajuda. Não temos como não mexer no ICMS (imposto estadual). Estamos num momento em que há ambiente de aprovação,
Os debates agora não estão tendo grande repercussão como ocorreu com a Previdência…
Nesse momento, nós temos o representante do Executivo que tem puxado a pauta diariamente, matinalmente.
O presidente Jair Bolsonaro está atrapalhando ?
Não. Só acho que temos de discutir. Há um interesse dos setores produtivos que estão todos mobilizados.
Rodrigo Maia declarou que não é preciso ter pressa na reforma. Ele está botando um pé no freio?
Não tem pé no freio, estamos cumprindo nossa agenda. Fico muito tranquilo porque a gente fez um plano de trabalho para cumprir e apresentar em meados de outubro o texto. Agora, o que Maia e eu temos dito é que precisamos construir o texto com tranquilidade, o que represente o pensamento da sociedade como um todo. Não podemos penalizar, por exemplo, determinado setor produtivo de tal forma que comprometa aquele setor. É preciso ver como calibrar isso, com transição ou de alguma maneira que vamos enfrentar esse debate.
A demora do governo em enviar a sua proposta não atrapalha o trabalho?
Não, porque estamos trabalhando no texto do Baleia (Baleia Rossi, líder do MDB na Câmara, deputado que apresentou o texto) e do professor Appy (Bernard Appy, economista que elaborou a proposta). Eu sou relator da PEC 45. Eu tenho de partir dela. Não sou relator de outra matéria.
Como o senhor vai trazer os Estados para a PEC 45?
O presidente Rodrigo Maia tem liderado esse debate com os governadores. Temos de fazer um debate porque alguns Estados defendem que a transição seja menor. Outros defendem que se mantenha.
Como será tratado o problema da desigualdade regional dentro da reforma? Será criado um fundo?
É importante que um País como o nosso, que tem vários ‘países’ na mesma federação com traços diferentes, tenha políticas definidas. Dá para construir uma política de desenvolvimento regional em que se possa cumprir esse papel. Queremos um sistema que dê clareza e isso não vai impedir que cada Estado possa ter um ambiente de criar dentro da sua vocação um ambiente de desenvolvimento.
E os incentivos? Como será tratada a Zona Franca?
Vamos ter de dar uma solução e vai passar ao final por uma constituição política. Ninguém decide, não sou eu quem vai decidir. Mas temos que dar uma solução para a Zona Franca.
Na reforma da Previdência o governo tinha o secretário Rogério Marinho como negociador. Quem será o Marinho da tributária?
O governo é quem tem que falar, mas eu gosto muito do Marinho. É um bom negociador para a reforma tributaria e para outros temas ligados à área econômica. Ele já tem um trânsito com a gente, já trabalhamos juntos na reforma trabalhista e previdenciária. Ele é habilidoso, tranquilo. Tem essa proximidade conosco. Mas isso cabe ao governo definir.
Qual é seu cronograma para votação?
Em outubro, a gente encerra as audiências públicas e a partir dessa construção define o cronograma. Há ambiente para ir ao plenário da comissão antes do fim do ano.
O projeto será votado no plenário da Câmara até o fim do ano?
O desejo é esse. Se pudermos, vamos encerrar o ano entregando ao País a reforma previdenciária e a tributária. Estou falando da Câmara.
Parlamentares reclamam ainda da desorganização na articulação depois de sete meses de governo?
Aprovamos Previdência assim. O Parlamento se adaptou a esse modelo do governo. Até porque o Parlamento tem uma responsabilidade com o País. Tudo que está na agenda do Parlamento vamos tocando e organizar. Não precisa do governo organizar isso não. Nós vamos tocar. Essa é uma pauta que não tem viés ideológico.
Na Previdência, o Congresso cobrou muito a posição do presidente Bolsonaro. E na tributária?
Eu não sei qual a opinião do presidente. Na Previdência, havia o apelo por tinha uma opinião do presidente contra a reforma. A reforma tributaria é diferente porque o clamor dela é de todo o mundo.
Maia disse que escolheu o senhor pela sua habilidade e experiência. É um peso muito grande ser o relator?
É um desafio muito grande, é uma reforma muito complexa. Tenho a convicção de que vamos aprová-la. Acho que vai ser um momento muito marcante para mim, na minha carreira. Espero que possamos ter essa capacidade de juntos, como parlamento, Câmara e Senado, transformar em um momento em que também o mundo está vivendo uma revolução.
Fonte: Estadão