Projeto prevê veto a benefícios fiscais para empresa com dívida “contumaz”
O projeto de lei que o governo vai encaminhar nos próximos dias ao Congresso Nacional para apertar as regras de cobrança da Dívida Ativa da União vai proibir que devedor classificado como “contumaz” possa usufruir de benefícios fiscais pelo prazo de dez anos. Ou seja, impede, por exemplo, a entrada dessas companhias em parcelamentos especiais com desconto de juros e multa, o conhecido Refis. A empresa contumaz também terá o CNPJ cancelado.
“Estamos de olho em estruturas empresariais montadas para não pagar tributos”, disse o procurador-geral-adjunto de Gestão da Dívida Ativa da União e do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), Cristiano Neuenschwander, em entrevista ao Valor.
Segundo ele, o devedor contumaz é aquele que rola, por mais de um ano, débitos de valor igual ou superior a R$ 15 milhões e que praticou algum ato ilícito. A definição, inexistente na legislação federal, vai constar do projeto de lei.
“O que a gente está de olho e tentando trazer uma medida que nos dê instrumento que a gente consiga combater é o devedor que faz isso de forma deliberada, aquele que pratica alguma fraude, que se utiliza de algum mecanismo para burlar a cobrança fiscal, usa sócios que não são verdadeiros”, disse Neuenschwander. “Ele tem que ter cometido algum ilícito e no projeto a gente vai trazer algumas condutas que tipificam esses ilícitos.”
Com o PL, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) terá ainda autorização para negociação direta com empresas inscritas na dívida ativa da União, mas que não cometeram nenhum ato ilícito. O objetivo é tentar receber dívida de empresas em situação econômica deficitária (falidas, em recuperação judicial ou sem atividades operacionais) e que não têm nem sequer condições de aderir aos parcelamentos especiais com descontos de juros e multas, o Refis.
Para Neuenschwander, essa é uma forma de receber algo dessas companhias cujas dívidas, já consideradas irrecuperáveis, sobem significativamente com incidência de multas e juros. “O PL preenche algumas lacunas”, contou, mencionando o caso das empresas devedoras e que não tiveram comportamento ilícito.
Atualmente, a Dívida Ativa da União total soma R$ 2,1 trilhões, sendo que R$ 1,3 trilhão é classificado como irrecuperável. Dos R$ 800 bilhões que podem ser recuperados, R$ 300 bilhões estão parcelados. Do restante, a cobrança está em andamento ou sendo discutida judicialmente. A recuperação da dívida no ano passado foi de R$ 24 bilhões.
Para estimular o pagamento, o procurador-geral-adjunto destacou que, no segundo semestre, a PGFN colocará em prática um projeto iniciado em 2017 que é a utilização de um call center para realizar a cobrança. Além de ligações, poderão ser enviadas mensagens informando o débito ao contribuinte.
A PGFN também está trabalhando em um outro projeto, que tem como objetivo regulamentar artigos da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da reforma da Previdência Social, para estabelecer critérios mínimos para a realização dos parcelamentos especiais com desconto de juros e multas. Com o projeto, Neuenschwander quer aproveitar para detalhar pontos do Código Tributário Nacional.
A PEC veda a inclusão de contribuições previdenciárias em parcelamentos com prazos superiores a 60 meses. Para impedir descontos em dívidas previdenciárias por meio de isenção fiscais ou de permissão de abatimento de dívida com uso de prejuízo fiscal ou base de cálculo negativa, a PEC prevê nessas situações que o Regime Geral de Previdência Social (RGPS) deve receber compensação financeira.
“A nossa previsão é uma Lei Geral de Parcelamentos Especiais. O Código Tributário Nacional já tem regulamentação, mas nós queremos trazer mais algumas coisas, algumas disciplinas”, contou, acrescentando que assim que for aprovada a reforma da Previdência o governo quer encaminhar o “mais breve possível” a sua regulamentação.
Como não tem como conter o ímpeto do Congresso Nacional em aprovar o Refis, a ideia do governo é estabelecer alguns limites a partir da aprovação da reforma da Previdência Social. Por exemplo, está sendo estudada a criação de faixas de descontos, o que também poderá ser válido para dívidas tributárias. “A lei geral de parcelamentos especiais vai trazer limites para a realização de regimes especiais”, afirmou o procurador. “É uma atualização do Código Tributário Nacional”, complementou.
Com as medidas de combate aos grandes devedores, o governo ataca uma das principais críticas à proposta de reforma da Previdência da equipe de Michel Temer. Na época, muitos parlamentares e opositores defenderam a cobrança das dívidas antes de mudar as regras previdenciárias, reduzindo o benefício do trabalhador.
Fonte: Valor Econômico