País tenta acertar o passo para combater fraude corporativa
Após um ano marcado por graves suspeitas envolvendo empresas mundo afora, especialistas discutem o que pode ser feito pelo governo e pelas companhias para melhorar o ambiente de negócios no Brasil.
O diversificado cardápio de fraudes e denúncias corporativas servido ao longo de 2011 não vai deixar saudades.
O ano terminou com uma nuvem de suspeitas pairando sob empresas de todas as partes do mundo. Especialistas, porém, dividem as causas dos problemas em dois grupos.
Em um deles estão companhias de países que enfrentam o pior momento da crise.
Nesse caso, as fraudes seriam a forma encontrada para camuflar maus resultados, ganhando tempo para driblar analistas e investidores para que os infratores sejam descobertos apenas quando os estragos estiverem feitos.
O Brasil está em outro grupo. Por aqui as irregularidades seriam resultado muito mais da combinação entre controles frouxos, má fiscalização e brechas encontradas na lei.
Para os que defendem essa tese algumas mudanças precisam ser feitas com urgência. Uma delas diz respeito à inclusão, de forma objetiva, da corrupção privada na legislação.
“É uma recomendação das diretivas da União Europeia que precisamos seguir. Só assim será possível aplicar punições efetivas. Mesmo a corrupção no âmbito público está a cada dia mais dependente da figura do corruptor privado, como vários casos recentes escancararam”, afirma Miguel Reale Júnior, que foi ministro da Justiça do governo Fernando Henrique Cardoso.
Isabel Franco, sócia do Koury Lopes Advogados (KLA), defende a mesma bandeira. Para a especialista, como signatário de diversos tratados internacionais anticorrupção, o Brasil precisa cobrar bem mais de suas empresas.
“Os empresários brasileiros ainda não se deram conta de sua responsabilidade. Toda empresa com relação comercial ou financeira com estrangeiros pode sofrer investigações internacionais a qualquer momento”, alerta.
Mesmo companhias brasileiras com ações nos Estados Unidos e sujeitas à Lei Contra Práticas de Corrupção no Exterior (FCPA, na sigla em inglês) e as que fazem negócios ou mantêm operações no Reino Unido e são supervisionadas pela lei local, conhecida como UK Bribery Act, ainda deixam muito a desejar quando o assunto é transparência, critica a advogada.
O fato de estar em evidência por seu crescimento e pelos preparativos para sediar os mais importantes eventos esportivos do planeta terá de fazer com que o comportamento mude em breve. Afinal, não serão apenas os grandes investidores que estarão com os olhos voltados para o país.
“O Brasil é a bola da vez também para as autoridades internacionais anticorrupção. A tendência é que americanos e ingleses ampliem a supervisão às empresas brasileiras que fazem negócios com esses países”, acredita José Francisco Compagno, sócio-líder da área de investigação de fraudes da Ernst & Young Terco.
Uma forma de obrigar que não apenas empresas de grande porte se interessem por ampliar o combate à corrupção é fazer com que a lei brasileira sobre o tema seja ajustada para ficar mais parecida com as regras internacionais, sugere.Com uma norma única, todas teriam de se adequar.
Cooperar ou calar?
Outra falha grave da legislação brasileira no que se refere à corrupção e prática de fraudes está na falta de mecanismos de autodenúncia.
Comuns na lei americana, eles estabelecem atenuantes para punições. No Brasil, sua ausência é sintoma direto do vácuo jurídico em torno da figura da corrupção privada.
“Da forma como estamos estruturados hoje, a rigor, as empresas não têm sequer um órgão para centralizar as delações”, afirma Antenor Madruga, sócio do Barbosa, Müssnich & Aragão Advogados.
“Tanto que é comum uma empresa comunicar ao departamento de Justiça americano que cometeu uma falha e não fazer o reporte nas mesmas dimensões às autoridades brasileiras, ainda que tenha operações aqui”, compara.
Pior do que não poder contar com os benefícios que as autoridades americanas reservam a quem pratica o “first call” – que em tradução livre para o português significaria algo como “ligue primeiro e me avise antes que eu descubra por minha própria conta.” – é sair com a imagem arranhada.
“As empresas temem se antecipar às investigações e reconhecer que erraram porque, dada a insegurança dessa ferramenta no Brasil, podem sofrer danos reputacionais irreparáveis. Por isso acabam tendo uma atuação passiva, aguardando para ver o que acontece ao longo do processo”, diz Giovanni Falcetta, do Mattos Filho.
Também habituada a atender empresas que vivem esse dilema, Sylvia Maria Urquiza, sócia da área penal empresarial do escritório Trench, Rossi e Watanabe, relaciona outros fatores que têm feito com que a autodenúncia se popularize nos Estados Unidos.
“A garantia do sigilo e de que a duração das investigações pelo departamento de Justiça americano será de seis meses a, no máximo, dois anos são decisivas para as empresas.”
Fonte: Brasil Economico