Nova tributação para renda fixa demanda também mexer na poupança
A mudança na tributação de ativos de renda fixa atrelados à variação da Selic que está em estudos pelo governo é uma boa medida, pois além de aumentar a participação de títulos pré-fixados e vinculados à inflação na dívida pública federal, deve requerer alterações também na remuneração da caderneta de poupança, segundo economistas ouvidos pela Agência Estado. “Mexer nessas duas questões é fundamental e precisa ser feito simultaneamente, pois há risco de uma parte expressiva dos investimentos em renda fixa migrar para a poupança, como começou a ocorrer de alguma forma em meados de 2009 quando a Selic chegou a 8,75% ao ano”, comentou o economista e sócio da MCM, Antônio Madeira.
Na avaliação de Madeira, o ideal seria o Poder Executivo editar uma medida provisória determinando que todos os ativos de renda fixa, independente dos seus prazos, pagassem a alíquota de 22,5% de imposto de renda. Por outro lado, no caso dos investimentos pré-fixados e vinculados à inflação, aquele tributo seria cobrado progressivamente, da seguinte forma: 22,5% para aplicações até seis meses, 20% para ativos entre seis e 12 meses, 17,5% para investimentos entre 12 e 24 meses e 15% para investimentos acima de dois anos.
“Contudo, por questões de arrecadação, talvez o governo prefira elevar a tributação sobre os ativos de renda fixa atrelados à Selic, mesmo que para isso seria necessário antes a aprovação da Câmara e do Senado por maioria simples, com entrada em vigor no ano seguinte”, destacou Madeira.
Para o economista-chefe da LCA, Braulio Borges, deveria ser bem escalonada a tributação sobre os ativos de renda fixa, variando de uma taxa de imposto de renda ao redor de 10% para ativos de 10 anos de vencimento para uma marca próxima a 40% para investimentos inferiores a seis meses. “O importante é o governo desindexar a dívida pública em ativos vinculados à Selic”, destacou. “Somar a parte do estoque desse passivo federal que é atrelado à variação da taxa básica de juros mais as operações compromissadas realizadas pelo, equivale a metade da dívida pública mobiliária federal, o que tira potência da ação da política monetária”, afirmou.
De acordo com o professor da PUC-RJ e economista-chefe da Opus Gestão de Recursos, José Márcio Camargo, é positiva a mudança da tributação para ativos de renda fixa vinculados à Selic, pois ela vai requerer necessariamente uma mudança “que já é tardia” da remuneração da caderneta de poupança. “Não faz sentido haver uma taxa de retorno fixa, que é considerável, para um investimento de tão baixo risco”, afirmou. “No entanto, é preciso ter muito cuidado para a alteração de regras, a fim de evitar eventuais descasamentos entre ativos e passivos do setor habitacional”, disse. De acordo com Antônio Madeira, o estoque de recursos do credito habitacional atingiu R$ 186,6 bilhões em dezembro de 2011, último dado disponível.
Poupança
Segundo Camargo, uma das saídas possíveis seria o governo adotar uma remuneração da caderneta de poupança com a Taxa Referencial mais 80% da Selic. Assim, quando caísse ou subisse a taxa básica de juros a simetria entre a remuneração de ativos e passivos vinculados à poupança seria mantida. Para Madeira, uma alternativa viável seria o governo estabelecer uma data de corte para a remuneração da poupança baseada pela TR mais 6,17% ao ano e a nova norma. “Assim, haveria harmonia entre o respeito dos contratos antigos e a necessidade de adaptar os novos às regras alteradas”, disse.
Para os especialistas, a preocupação do governo com a mudança de remuneração dos ativos de renda fixa à Selic não está somente relacionada à intenção de reduzir os gastos do Tesouro com juros da dívida mobiliária federal. O outro motivo é a tendência de queda da Selic, que para alguns especialistas pode ficar abaixo de 9% neste ano. O Itaú Unibanco, por exemplo, estima quie a Selic chegará a 9% neste ano. Já o chefe de Pesquisa de Mercados Emergentes para as Américas da Nomura Securities em Nova York, Tony Volpon, acredito que os juros básicos vão para 8,5% em 2012. “Há manifestações públicas recentes de dirigentes do Banco Central que indicam que há interesse em que a taxa fique numa marca mais baixa do que o patamar ao redor de 9,5% que foi cogitada pelo mercado após a divulgação da ata da reunião do Copom ocorrida em janeiro”, disse.
De acordo com Antônio Madeira, a remuneração atual da caderneta de poupança, sobre a qual não incide a cobrança de imposto de renda, equivale a um CDB de 30 dias que paga 7,74% ao ano. Na avaliação dos especialistas, se a Selic ficar pouco abaixo de 9% neste ano muito provavelmente o governo precisará tocar na questão que mexe na remuneração da caderneta de poupança, por mais espinhoso que seja o tema no aspecto político. “Mexer com a questão da remuneração da poupança no Brasil talvez seria até pior do que propor a privatização da Petrobrás”, comentou Madeira.
* Agência Estado