Mudança no ágio surpreende empresas
Interlocutores que negociavam com o governo sobre a dedutibilidade fiscal do ágio pago em fusões aquisições estão perplexos e incrédulos diante da notícia, publicada ontem pelo Valor, de que o fim do benefício fiscal em transações entre partes independentes está sob análise da presidente Dilma Rousseff.
Embora todos saibam que existem muitos técnicos da Receita Federal e da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN) que têm verdadeira ojeriza pela palavra “ágio”, discussões realizadas nos últimos meses (sendo a mais recente em agosto) levavam os contribuintes a crer que estava tudo certo para a manutenção do benefício fiscal, embora com diferenças e restrições. O fim completo da dedutibilidade tinha saído da pauta de negociações há mais de um ano, embora fosse o desejo inicial do Fisco.
Quatro fontes próximas às tratativas ouvidas pelo Valor, que pediram para não se identificar, se mostraram bastante surpresas com a notícia, e procuravam verificar com seus interlocutores no governo se existe uma decisão final sobre o assunto.
Alfried Plöger, vice-presidente da Associação brasileira das Companhias Abertas (Abrasca), disse que o Fisco nunca prometeu oficialmente que manteria o benefício fiscal, mas que isso teria ficado “sub-entendido” nas diversas conversas realizadas.
O que estava na mesa de negociação com o setor privado era o fim da possibilidade de dedução fiscal do ágio gerado em operações intragrupo (ágio interno) e também uma mudança na forma de cálculo do ágio existente em operações entre empresas independentes (ágio externo), que tenderia a reduzir o benefício, mas não acabar com ele.
Embora não fosse a preferência dos contribuintes, as empresas já haviam se conformado com essas mudanças.
Até 2007, antes do início da adoção do padrão contábil IFRS no Brasil, o ágio dedutível fiscalmente era obtido pela diferença entre preço de compra e o patrimônio líquido contábil da adquirida. Desde então, houve práticas divergentes sobre como deveria ser o cálculo – se pela regra vigente até 2007, ou pelo critério previsto no padrão contábil internacional IFRS.
E o que a medida provisória faria era deixar claro que, a partir de agora, vale o mesmo cálculo usado para o IFRS, que chama de ágio por expectativa de rentabilidade futura (goodwill) somente o valor residual pago em uma aquisição.
O IFRS pressupõe que, do valor desembolsado acima do patrimônio líquido da empresa adquirida, uma parcela se explica pelo fato de alguns ativos e passivos desta empresa estarem com valor contábil desatualizado, o que precisa entrar na conta. Além disso, costuma se pagar por ativos intangíveis que muitas vezes não estão contabilizados no balanço da empresa comprada – como marcas desenvolvidas internamente.
Somente o que sobra após feita toda a alocação do preço é que se chama de goodwill. Essa forma de cálculo tende a reduzir o tamanho do ágio e consequentemente o benefício fiscal para a adquirente.
Outro tema que estava em discussão se referia aos ágios pagos em transações ocorridas nos últimos anos, mas que não foram totalmente amortizados, já que há um prazo de cinco a dez anos para que isso seja feito. Pelo que era conversado, haveria um tempo de transição durante o qual o ágio calculado pelo sistema antigo ainda poderia ser amortizado.
A proposta que era debatida também previa a manutenção do prazo de cinco a dez anos, como é feito hoje – e não a partir do quarto ano após a aquisição, como chegou a ser aventado há um ano.
Valor Econômico