Juros sobem influenciados por dados do varejo e dúvidas sobre inflação
A divulgação de dados que mostraram desempenho do varejo brasileiro acima do esperado levaram as taxas de juros projetadas nos contratos de Depósito Interfinanceiro (DI) negociados na Bolsa de Mercadorias & Futuros (BM&F) as máximas desde o dia 17 de abril, data do último encontro do Comitê de Política Monetária (Copom).
No fim da sessão regular, antes dos ajustes finais, os contratos devolveram parte dos ganhos, mas ainda assim fecharam majoritariamente em alta, também puxados pelo aumento do rendimento dos títulos do governo americano (Tresuries) e pela valorização do dólar.
Antes dos ajustes finais na BM&F, a taxa do DI de vencimento em julho de 2013 (DI julho/2013 subia a 7,485%, de 7,465% ontem. O DI janeiro/2014 apontava estabilidade, a 7,98%. Na mesma comparação, o DI janeiro/2015 avançava a 8,44%, de 8,42%, enquanto o DI janeiro/2017 atingia 9,14%, de 9,15% na véspera, após máxima de 9,23% no dia.
Segundo números divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o volume de vendas no varejo restrito caiu 0,1% em março na comparação com fevereiro, resultado superior à média, de -0,5%, estimada pelo Valor Data junto a 13 economistas, e melhor que o intervalo das projeções, que ficou entre -0,3% e -1,5%.
“Com o Banco Central operando no modo ‘data dependence’, qualquer indicador que mostre atividade mais forte na ponta do consumo aumenta a incerteza sobre a eficácia de um ciclo de monetário suave para segurar a inflação”, disse o diretor de tesouraria de um banco, referindo-se à opção tomada pelo Copom desde março de atuar conforme a apuração dos indicadores de preços e de atividade para calibrar os juros.
A mesma Pesquisa Mensal do Comércio (PMC) divulgada hoje pelo IBGE revelou que o deflator implícito — medida utilizada para verificar a diferença entre a receita nominal e a receita real no setor — foi de 8,3% nos 12 meses encerrados em março, o maior desde abril de 2005, quando havia batido 8,7%, ressaltou o economista da Quest Investimentos, André Muller. “O deflator funciona como uma medida do aumento de preços, e desde 2005 não era tão alto. Isso confirma que a inflação já está batendo no comércio e enfraquecendo as vendas, principalmente no setor de supermercados, que já registra dois meses de queda”.
A influência do indicador doméstico de varejo hoje foi mais influente para os investidores do mercado de juros do que o comportamento dos títulos do governo americano. Mas esse vetor externo também trabalhou a favor de juros mais elevados na BM&F.
O rendimento desses papéis, principal referência do mercado global de renda fixa, passou a subir durante a tarde, influenciado pelas incertezas sobre a retomada econômica nos países industrializados do hemisfério norte. O Produto Interno Bruto (PIB) da zona do euro recuou 0,2% no primeiro trimestre, enquanto nos Estados Unidos, a produção industrial caiu 0,5% em abril ante expectativa menos pessimista, que estimava 0,2% de queda.
A aposta que ganha corpo no mercado, embora ainda não seja majoritária, é a de que o Federal Reserve (Fed, o banco central americano) decida antecipar a normalização da política monetária, reduzindo a injeção de recursos no sistema financeiro por meio da compra de bônus. No curto prazo, esse cenário já pressiona a taxa de câmbio, favorecendo o dólar.
Assim, a moeda americana ganha terreno em relação às principais moedas no mundo, inclusive ao real. E a depreciação da divisa brasileira pressiona a inflação e, portanto, justifica a alta dos DIs.
O contraponto para esse movimento, segundo operadores, é a onda de alívio monetário se espalhando pelo mundo. A decisão do BCE de cortar os juros no início do mês estimulou ações de outros BCs ao redor do mundo, como o da Índia, Austrália, Polônia, Coreia do Sul, Israel, Vietnã e Siri Lanka. Muitas dessas decisões surpreenderam o mercado e foram adotadas como instrumento para fazer frente à atividade doméstica fraca e às perspectivas moderadas para o crescimento global.
Ponderar essas forças é, portanto, o grande desafio para os investidores e, principalmente, para o próprio Banco Central brasileiro. Ainda mais considerando que, ao contrário do que se vê nesses outros países, o Brasil convive com inflação alta.
O foco dos investidores se volta agora para os dois últimos dias da semana. Entre a quinta-feira e a sexta-feira, o mercado terá uma agenda que comporta exposições do presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, do diretor de política econômica, Carlos Hamilton Araújo, além da divulgação do Índice de Atividade Econômica (IBC-Br) da autarquia referente a março.
Nesta quinta-feira (16), às 8h30, sai o IBC-Br. Na sequência, no Rio de Janeiro, Tombini abre o XV Seminário de Metas para a Inflação. E, na sexta-feira, acontece o encerramento do mesmo evento, por Carlos Hamilton. Para gestores de recursos, tesoureiros e investidores, oportunidades para que sejam apuradas pistas do rumo dos juros no país.
Valor Econômico