Hora de passar o bastão precisa ser bem planejada
Preparar filhos e netos para a sucessão é um dos principais desafios das empresas familiares. Se bem planejada, a passagem do comando pode resultar até em aumento da receita da companhia e em mais dinheiro para as mãos dos sócios. Se o assunto for postergado, a morte do fundador pode significar o fim do negócio, segundo especialistas em governança corporativa. Uma sucessão bem feita começa com um diagnóstico sobre os interesses dos herdeiros. A formação de um conselho de família pode ajudar na identificação da consultoria a ser chamada.
“A partir daí é feito um plano de desenvolvimento. Quem quer ficar na companhia, vai se preparar para isso. Quem não quer, vai se preparar para ser acionista”, afirma Ieda Carvalho, diretora-executiva da Family Business Network (FNB-Brasil), associação mundial de empresas familiares.
Filhos que querem seguir com o negócio familiar devem trabalhar, segundo especialistas, em todos os departamentos da companhia – se for numa indústria, isso significa conhecer a atividade desde a chegada das matérias-primas até a saída dos produtos.
Algumas empresas querem que o herdeiro conheça primeiramente o negócio da família e depois trabalhe alguns anos em outra companhia antes de voltar. Outras preferem que, após concluir a faculdade, o candidato fique fora antes de ir para a empresa familiar.
Para quem optou por outro rumo, Ieda aconselha um preparo para ser acionista. “Há cursos para isso. Os herdeiros precisam ler balanços e ter noção básica do negócio. Eles não podem ir para uma assembleia de acionistas e ficar lá sem ter a menor noção do que está ocorrendo na companhia”, afirma.
No preparo para a sucessão, o conselho de família deve estabelecer regras para os herdeiros que ficarem na empresa. “Se um deles chega sempre atrasado, quem vai chamar sua atenção? É preciso estabelecer regras e o conselho serve para blindar os problemas familiares”, diz.
Aproximadamente 85% das empresas brasileiras são familiares e participam com cerca de 63% do Produto Interno Bruto (PIB). Ou seja, há um amplo mercado para consultorias e escritórios de advocacia especializados em governança corporativa e sucessão familiar. “A melhor sucessão é feita com o fundador vivo. Ele passa a história, a cultura da empresa para o novo comandante. O filho não pode ser diretor em função do sobrenome, mas pelo que conquistou. Quem vai dirigir uma companhia tem de ter o respeito dos funcionários”, diz Domingos Ricca, sócio-diretor da DS Consultoria.
Heloísa Bedicks, superintendente-geral do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC), diz que sucessão é assunto importante nas empresas porque envolve questões profissionais e emocionais. “O fundador imagina que o desafio de construir a empresa será passado automaticamente para os filhos, e nem sempre é assim. Muitas vezes o herdeiro não tem vocação para o negócio”, diz. Foi o caso da família Moreira Salles, fundadora do Unibanco. “Só o Pedro ficou no banco”.
Marcelo Santos, presidente da consultoria Doers, recomenda que, a partir de dez anos, os herdeiros comecem a frequentar a empresa. “Fica mais fácil ver se o filho tem ou não perfil para tocar o negócio.” Em casos de forte disputa entre os familiares, para Santos o caminho é a contratação de uma consultoria profissional. “Muitas vezes, é melhor profissionalizar a empresa e levar os familiares para o conselho de administração.”
Para ele, as empresas familiares brasileiras estão bem mais preparadas para a sucessão do que no passado. “Mas há ainda muito a ser feito. O movimento de governança corporativa é novo no Brasil. As companhias estão na segunda ou terceira gerações. Na Europa, estão na sétima e oitava gerações”, diz. O fato é que, se a sucessão não for tratada com antecedência e transparência, até mesmo uma empresa familiar lucrativa pode fechar.
* Valor Econômico