Entrevista: Jorge Gerdau, coordenador da Câmara de Gestão e Planejamento do governo
“Dilma não vai aumentar a carga tributária”
O coordenador da Câmara de Gestão e Planejamento do governo, Jorge Gerdau, diz que os empresários e o Congresso precisam ficar vigilantes para evitar aumento de impostos.
Há um ano, o empresário Jorge Gerdau, presidente do Conselho de Administração do grupo Gerdau, ocupa um gabinete no terceiro andar do Palácio do Planalto, próximo à sala da presidenta Dilma Rousseff, como coordenador da Câmara de Gestão e Planejamento do Governo Federal. Nos últimos dias, seu trabalho começou a aparecer com a proposta defendida por ele de uma reforma tributária fatiada, a começar pela unificação do PIS/Cofins. Sua ideia foi discutida na sexta-feira 25, no gabinete de Dilma, com Nelson Barbosa, secretário-executivo da Fazenda, e Carlos Alberto Freitas Barreto, secretário da Receita Federal.
No fim, Dilma deu o sinal verde para se levar à frente a proposta. “A presidenta Dilma definiu como prioridade do governo”, afirmou Gerdau, nesta entrevista exclusiva concedida à DINHEIRO. A proposta já nasce polêmica. Como se trata de um modelo na qual o imposto será creditado nas cadeias produtivas, está previsto um aumento de alíquota do PIS/Cofins. Gerdau diz que não haverá aumento da carga tributária. A própria Dilma teria imposto essa condição. Gerdau reconhece, porém, que é preciso ter cuidado. A tentação do governo em aumentar a arrecadação é grande.
Em que consiste a proposta de reforma tributária do sr.?
Há muito tempo, o setor siderúrgico tem uma preocupação grande com a questão da competitividade, e um dos grandes temas dessa discussão é o problema dos impostos cumulativos. Embora o PIS e o Cofins, assim como o ICMS e o IPI, sejam teoricamente impostos não cumulativos, não é assim que funciona. Isso gera uma burocracia enorme para definir quais os créditos a ser descontados em impostos.
Sua proposta é adotar um sistema de cobrança de impostos não cumulativos, a começar pelo PIS/Cofins?
Hoje, isso só existe na teoria. Na prática, é complicadíssimo saber o que deve ser ou não creditado. São discussões intermináveis. O que está se propondo é que se estabeleça no PIS/Cofins essa metodologia de se gerar créditos em cada etapa na cadeia de um determinado produto.
O custo das empresas com esse sistema atual é muito grande?
É uma burocracia enorme. Na Gerdau, por exemplo, nós temos 100 pessoas para cuidar dessa papelada, só para saber o que entra ou não como crédito. Na Petrobras, são 900. Em vez de produzir, essas pessoas estão trabalhando na burocracia. Esse é um dos custos Brasil. Dependendo do produto, nós devemos ter um total de 15% de impostos escondidos no custo do produto.
Essa estrutura compromete a produtividade das empresas?
Há uma grande diferença entre competitividade e produtividade. O Brasil tem índices de produtividade bastante bons. A produtividade da indústria brasileira é muito boa. Agora, se você tomar os fatores de não competitividade, como essa estrutura tributária, esses impostos e encargos que recaem sobre a energia elétrica, os impostos e encargos sobre o gás, e acrescentar a estrutura de logística, são todos fatores extramuros das empresas. Nós precisamos atacar esses problemas para aumentar a competitividade no País.
Como a presidenta Dilma reagiu à proposta apresentada pelo sr.?
Graças a Deus, a presidenta Dilma está começando a trabalhar firmemente sobre esse tema.
Mas a proposta prevê um aumento da alíquota do PIS/Cofins.
Ao se creditar os impostos na cadeia, isso vai levar a uma pequena compensação com um aumento da alíquota do PIS Cofins, mas não vai haver diferença no preço final. Isso porque vai ter uma compensação da cobrança do PIS/Cofins em cada etapa na cadeia do produto. O que essa modernização do sistema não pode é aumentar a carga tributária. A soma dos dois impostos, o PIS e o Cofins, é de 9,25%.
O PIS/Cofins será unificado?
O mais importante não é a unificação, mas sim aproveitar os créditos das contas anteriores. O importante é a questão da cumulatividade. Hoje, por exemplo, o ICMS que pago para consumir energia na Gerdau não me permite que seja usado como crédito. Se eu puder me creditar desses impostos, eu vou pagar a energia sem o tributo, mas no final a alíquota terá que ser um pouco maior.
De quanto seria o aumento do PIS/Cofins?
Eu não tenho esse número. No aço, o aumento deve levar o imposto para 12% a 15% provavelmente, mas eu acabo com toda essa burocracia que existe hoje. O Brasil fica em condições de igualdade para competir contra os importados.
Por que a igualdade com o importado?
O produto importado só paga o PIS e o Cofins quando entra no País. Não paga as etapas anteriores. O produto importado só paga 9,25% sobre o preço final. Esses 15% escondidos na minha cadeia, esses caras não pagam. Não pagam o IOF, o ICMS, o ISS. Essa soma toda corresponde a mais ou menos 10% a 15% sobre o custo, dependendo do produto.
Essa nova estrutura não vai exigir burocracia também?
Se eu tenho uma estrutura tributária definida, as empresas podem automatizar o processo. Hoje, só uma parte pode ser creditada, outra não. Não há um critério definido. Não tem regularidade. A confusão de critérios é uma loucura total. No novo modelo, haverá um padrão automático.
Essa nova estrutura tributária inclui também o ICMS?
Não agora. Essa será a segunda etapa. Vamos começar com o PIS/Cofins, e depois partimos para todos os outros impostos. A novela de acabar com os outros impostos é um segundo capítulo, mas tem que começar. A caminhada é longa e temos que dar o primeiro passo. Na verdade, o primeiro passo já foi dado com a medida de resolução do Senado 72, que acabou com a guerra dos portos. Foi o primeiro passo dessa caminhada.
Há quanto tempo vem se discutindo esse novo processo?
Esse tema já vem sendo debatido. A Receita já está trabalhando há mais tempo, mas só agora veio a público.
Por que veio a público?
Porque houve um posicionamento formal da presidenta Dilma Rousseff de atacar esse problema, de definir como prioridade do governo. Ela quer resolver essa questão. A presidenta tem uma posição clara de que isso tem que ser corrigido. Quando ela assumiu a Presidência, ela já tinha essa visão, e agora decidiu atacar esse tema.
Foi definido um prazo?
Prazo não tem, mas quando a presidenta resolve atacar um problema, as chances são de não demorar muito tempo.
O ministro Mantega também tem participado dessas discussões?
Esse tema já vem sendo debatido com o ministro Mantega.
Essa proposta é sua?
A ideia não é nova. O empresário já fala nisso há anos. Como havia a perspectiva de uma reforma tributária global, se alimentava essa ideia, mas, agora, chegamos à conclusão de que essa reforma global é impossível. Tem que ser fatiada.
Mas o empresário não pode receber mal essa proposta, já que vai haver aumento do PIS/Cofins?
A presidenta Dilma não vai aumentar a carga tributária.
O sr. tem falado com os empresários?
Sim, tenho falado sobre isso, e há posicionamentos a favor. O empresariado é ressabiado. Quando o governo mexe em imposto, é sempre forte a tentação de se aumentar a carga tributária. Quando houve a criação da teórica não cumulatividade do PIS/Cofins, me lembro que Armando Monteiro, então presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), calculava que o imposto deveria ser de 7,5%, e saiu 9,25%. A história depois mostrou que houve realmente aumento de carga tributária, não fosse o objetivo. Terá que se fazer um trabalho grande para evitar que haja aumento da carga tributária.
O empresário tem de ficar atento?
O empresário, o Congresso e a sociedade precisam ficar vigilantes. A filosofia e a tentação de se aumentar a carga tributária existe historicamente no País. Embora a presidenta tenha uma posição, no sentido contrário, o passado nos mostra que é melhor ter muito cuidado.
* Entrevista feita por Guilherme Barros, Revista Dinheiro
E de extrema importancia e urgencia essas medidas, parabens ao empresario Jorge Gerdau