Entenda a atual situação das contas públicas e possíveis medidas
O rombo nas contas públicas em 2016 poderá ficar em R$ 170,5 bilhões, segundo cálculos da nova equipe econômica do presidente em exercício, Michel Temer. Esse “buraco” – gastos acima das receitas (déficit), anunciado nesta sexta-feira (20) pelos ministros da Fazenda, Henrique Meirelles, e do Planejamento, Romero Jucá, será, se confirmado, o maior na história do país até agora.
Segundo Meirelles, esse valor é um “teto”, e o governo vai trabalhar para reduzir esse rombo. Uma das prioridades será tentar estancar a “sangria” que pode ter levado as contas públicas a esse patamar.
Para isso, os ministros de Temer armam um arsenal de medidas para os próximos dias. Elas envolvem reformas nas esferas trabalhista e previdenciária, dentre outras ações para cortar gastos e elevar a arrecadação.
Ao assumir o cargo, Henrique Meirelles, disse que a primeira grande ação do governo Temer na área econômica seria “controlar” o aumento de despesas públicas. Nesta sexta, ele informou que as primeiras medidas serão apresentadas na próxima semana.
Outra prioridade é enviar um projeto de lei ao Legislativo para mudar a meta fiscal deste ano a um patamar mais ajustado à previsão de rombo – e assim fechar o ano sem descumprir a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), que exige que essa meta seja cumprida.
O novo governo precisará de apoio político para aprovar medidas consideradas impopulares em seu esforço fiscal. Foi o que faltou ao ex-ministro da Fazenda Joaquim Levy no ano passado, quefracassou ao tentar fazer cortes mais profundos no Orçamento e alcançar uma meta de superávit primário (economia para pagar os juros da dívida) considerada ousada, e que depois foi revisada para baixo.
Para mostrar que está disposto a cortar na “própria carne”, Temer extinguiu nove ministérios no dia de sua posse, restando 24, com a exclusão e fusão de pastas. O ministro do Planejamento, Romero Jucá, anunciou a intenção de cortar até 4 mil cargos de confiança e funções gratificadas, o que representa 18,4% do quadro. O governo federal tem hoje 21,7 mil cargos comissionados. Esses cortes, porém, só têm efeito simbólico nos gastos do orçamento.
O governo do presidente em exercício também indicou que pretende fazer uma reforma na Previdência e não descartou o retorno de um imposto semelhante à CPMF (que ficou conhecido como ‘imposto do cheque’) para aumentar a arrecadação – medidas que enfrentam resistência de setores da população e do Congresso.
Entenda a atual situação do Orçamento e as possíveis medidas do novo governo para equilibrar as contas públicas:
Para que serve o Orçamento?
Ele existe para controlar as despesas e receitas do governo para cumprir as leis previstas pela Constituição. Para isso, o governo é obrigado a criar metas para garantir a saúde das contas públicas (evitando o chamado déficit, quando se arrecada menos do que se gasta).
Ele precisa explicar como os recursos arrecadados vão ajudar a cumprir esses objetivos. Ao prever as despesas, o ministério do Planejamento deve garantir que haja dinheiro para as áreas consideradas mais importantes. Para isso, ele cria prioridades que estão previstas no Orçamento.
De onde vem o dinheiro do Orçamento?
A maior parte dos recursos públicos vem da cobrança de tributos (impostos, taxas e contribuições) que são arrecadados nas esferas federal, estadual e municipal. Este dinheiro é administrado pela Receita Federal, que também controla as contribuições da Previdência que pagam os benefícios de aposentados e de outros segurados.
Outra parte dos recursos, a menor, vem de fontes que não passam pela Receita. Entre elas, as concessões de projetos em infraestrutura e dividendos pagos pela distribuição de lucro dos bancos públicos, além do salário-educação, que é uma contribuição paga pelas empresas para custear programas educacionais.
Como fecharam as contas públicas nos anos anteriores?
Em 2014, as contas do governo central (Tesouro, Banco Central e Previdência Social) registraram o primeiro déficit primário (receitas menos despesas, sem contar juros da dívida pública) em 18 anos, de R$ 17,24 bilhões.
Em 2015, um ano marcado pela recessão na economia e pelo pagamento das chamadas “pedaladas fiscais”, as contas do governo tiveram forte deterioração e registraram um rombo recorde de R$ 114,98 bilhões, ou 1,94% do Produto Interno Bruto (PIB).
Como o déficit fiscal afeta a dívida pública?
O déficit fiscal (despesas maiores que receita nas contas públicas – a diferença entre o que o governo arrecada e o que ele gasta) pode piorar a relação da dívida bruta (que é o total do que o governo deve) em relação ao Produto Interno Bruto (PIB) – um indicador acompanhado pelas agências de classificação de risco.
Hoje, ela está em 66,2% do PIB. Em 2010, ela estava em 51,7%. Quando o governo não faz economia para pagar os juros da dívida (superávit primário), ela fica maior.
Como funciona o controles das despesas públicas?
A lei estabelece dois tipos de despesas públicas: as chamadas “discricionárias”, que não são obrigatórias dentro do Orçamento, sobre as quais o governo tem controle e liberdade para cortar. Já as despesas obrigatórias – como o pagamento de pessoal, benefícios da Previdência e desonerações de tributos –, são “engessadas” e só podem ser cortadas com modificação de leis, e para isso precisam da aprovação do Congresso. Os gastos obrigatórios representam a maior parte do total previsto no Orçamento. Ou seja, o governo tem uma margem relativamente pequena para cortar despesas.
Quando o Governo pode bloquear gastos?
O chamado “contingenciamento” é o mecanismo que o governo tem para mudar a previsão de gastos ao longo do ano. No início de cada ano, o governo costuma emitir um decreto que limita as despesas que foram autorizadas na Lei Orçamentária Anual (LOA).
Só é possível cortar as despesas discricionárias ou as não obrigatórias por lei (como investimentos e custeio).
Mais bloqueios de despesas foram feitos em 2016?
O ministério do Planejamento, ainda no governo Dilma, autorizou em março um bloqueio de gastos no orçamento de 2016 de R$ 21,2 bilhões. O corte foi anunciado no relatório de receitas e despesas do Orçamento. Esse valor se soma ao bloqueio anterior de R$ 23,4 bilhões anunciado em fevereiro. Com isso, o corte total o orçamento de 2016 chegou a R$ 44,65 bilhões em relação à previsão original.
No corte de fevereiro, os ministérios de Minas e Energia, Saúde e da Educação tiveram os maiores bloqueios dos gastos sobre os quais o governo tem controle no Orçamento. Nos cortes de março, o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) teve seus gastos limitados de R$ 26,49 bilhões para R$ 23,28 bilhões. Também sofreram cortes os ministérios da Educação, Saúde, Minas e Energia e Ciência e Tecnologia.
Nesta sexta, no entanto, Meirelles informou que R$ 21,2 bilhões desses cortes serão revertidos – ou seja, esse dinheiro voltará a ser liberado.
Por que o Governo fez os bloqueios?
Os bloqueios de despesas foram feito na tentativa de evitar um déficit maior e de atingir a meta fiscal (economia para pagar os juros da dívida) fixada pelo Congresso para 2016.
No entanto, segundo projeções do mercado e analistas ouvidos pelo G1, independentemente do seu tamanho, o corte não seria suficiente para atingir a meta fiscal neste ano, nem para impedir um novo rombo nas contas públicas.
Qual é a previsão do rombo para este ano?
Em março, o governo Dilma pediu aval para um rombo de R$ 96 bilhões (gastar mais do que arrecadou) – o equivalente a 1,5% do PIB nacional. O governo justificou o rombo dizendo que um corte maior nos gastos pode frear ainda mais a economia.
Nesta sexta, a equipe do governo Temer informou que prevê um rombo bem maior – de R$ 170,5 bilhões até o fim do ano – o pior resultado fiscal da história do país e o terceiro ano seguido de déficit nas contas públicas.
Por que o governo Temer aumentou a previsão de déficit?
Além dos R$ 96,7 bilhões estimados antes, os ministros revisaram para baixo a estimativa de receita (o dinheiro que o governo vai arrecadar). A previsão caiu 4%, para R$ 1,0778 trilhão, por conta, entre outros motivos, da previsão de queda do Produto Interno Bruto (PIB) do país este ano. Segundo Meirelles, a previsão de receita estava superestimada.
O governo também prevê agora mais despesas: além de liberar R$ 21,2 bilhões em gastos que estavam bloqueados, existe ainda a previsão de gastos de R$ 9 bilhões com pagamento de despesas atrasadas dentro do PAC; de despesas de investimento do Ministério da Defesa e outras (R$ 3,5 bilhões), e gastos necessários para o setor da saúde de cerca de R$ 3 bilhões.
Há previsão ainda de efeitos da renegociação das dívidas dos estados, pagamentos atrasados a fornecedores e de dívidas com organismos internacionais, que serão, em parte, compensados com recursos arrecadados a partir da repatriação de ativos mantidos por brasileiros no exterior e não declarados à Receita Federal. O efeito líquido desses itens, segundo Meirelles, será de R$ 19,9 bilhões negativo.
G1