Demissão mal conduzida pode comprometer empresa
Francisco Valim havia acabado de desembarcar no Brasil, voltando de férias no exterior, quando recebeu um telefonema de um dos acionistas majoritários da Oi, companhia que presidia desde junho de 2011. Longe de desejar as boas-vindas, a ligação do sócio tinha um objetivo bastante controverso: demitir o executivo, que nem chegou a cumprir metade do mandato previsto em contrato (quatro anos).
Logo em seguida, a companhia emitiu um comunicado ao mercado apresentando o substituto de Valim, o presidente do conselho da Oi, José Mauro Mettrau Carneiro da Cunha, que assumirá o comando da empresa de telecomunicações até que um novo executivo seja contratado para o posto. Procurada pela reportagem, a Oi não quis comentar o assunto.
O impacto no mercado foi imediato. No dia em que a demissão foi noticiada, em 22 de janeiro, as ações da companhia acumularam queda de mais de 10%. Mas os efeitos não se refletiram apenas na percepção dos acionistas minoritários. Segundo destaca Luiz Marcatti, sócio da Mesa Corporate, a imagem da empresa no mercado de trabalho tende a ser severamente “manchada” com a forma como o processo todo foi conduzido.
Embora a fidelidade ao seu principal executivo não seja uma tradição na empresa – que já teve sete presidentes desde a criação do grupo Telemar/Oi, em 1998, uma média de um CEO a cada dois anos – uma demissão mal conduzida, e por telefone, deve dificultar a retenção e captação de talentos no mercado. Além disso, o fato pode gerar turbulências no clima organizacional e tornar as relações interpessoais daqueles que permanecem na companhia mais instáveis.
Segundo Marcatti, uma demissão mal conduzida transmite uma imagem muito ruim tanto para dentro quanto para fora. “Um executivo de renome pensará duas vezes antes de aceitar um cargo como presidente de uma instituição que não demonstra maturidade na hora de desligar seus funcionários”, afirma. Nesse sentido, a insegurança no posto poderá se refletir na demanda por um salário bem superior ao do ex-CEO.
Para a coordenadora Ana Cristina Limongi, do Núcleo de Qualidade de Vida no Trabalho da Fundação Instituto de Administração (FIA), casos como o de Valim são, infelizmente, muito comuns no mercado. “Os desligamentos geralmente são impessoais e mal conduzidos no Brasil. Algumas vezes, inclusive, beiram o assédio moral”, diz.
Ana Cristina ressalta que uma demissão por telefone, como a de Valim, geralmente expõe problemas de relacionamento entre as partes e dá margem a diversas interpretações. “Há diversas hipóteses que ficam no ar com uma atitude dessas. A companhia não valoriza a transparência nos relacionamento com seus funcionários? Os sócios não confiam nos executivos que contratam? Não há uma relação de respeito no ambiente corporativo?”, exemplifica.
Desse modo, uma demissão presencial com direito à réplica do executivo é sempre a melhor opção. “O desligamento de um funcionário de alto escalão pesa muito em seu currículo. Por isso, os motivos devem ser sempre muito claros, para que aquele profissional não fique manchado”, diz a coordenadora da FIA.
Essa demonstração de respeito é ainda mais importante em um mercado cada vez mais conectado, no qual tanto informações verdadeiras quanto meros boatos se disseminam rapidamente. “A empresa deve ter muito cuidado ao explicar o motivo da demissão. Qualquer deslize pode virar um problema para a imagem da companhia”, afirma Marcatti, da Mesa Corporate.
De acordo com levantamento recente da consultoria Produtive, realizado com 200 executivos de média e alta gerência demitidos em 2012, 43% apontam que tiveram uma experiência desastrosa no ato do desligamento, o que deixou uma imagem muito ruim da empresa onde trabalhavam. Entre os problemas mais comuns apontados pelos ex-funcionários está a falta de clareza na causa da demissão (33%) e a ausência de feedback quanto à performance, seja durante o trabalho ou no rompimento do contrato, deixando o profissional sem subsídios para melhorar alguma competência técnica ou comportamental.
Mas os esforços de comunicação da empresa não devem ser dirigidos apenas ao demitido. Segundo Elaine Saad, vice-presidente da Associação Brasileira de Recursos Humanos (ABRH-Nacional), cabe à companhia minimizar os impactos do desligamento de um executivo-chave no clima organizacional. “Tudo o que a companhia não comunica dá margens à especulação e à insegurança no ambiente de trabalho. Isso pode afetar a produtividade e a motivação das equipes.”
Por conta disso, os controladores da Oi, empresa que enfrenta problemas de imagem desde a privatização, deveriam ser mais cuidadosos, conforme destaca Pedro Sardinha, presidente da ABRH do Rio de Janeiro. Ele ressalta, contudo, que o país vem passando por amplo processo de amadurecimento na relação das empresas com seus colaboradores, em especial as de maior porte. Para ele, entre competência e preparo, duas características importantes de quem comanda são equilíbrio e elegância.
Por conta da escassez de profissionais qualificados no mercado, os executivos atualmente têm mais poder de escolha sobre onde querem desenvolver carreira. Portanto, a identificação com os valores da empresa tem se tornado a arma mais eficaz na atração e retenção dos melhores nomes. “O profissional vai levar em conta os princípios da corporação. Quando a companhia tem uma reputação desgastada, ela terá sérias dificuldades para convencer aquele executivo de que é a melhor opção que ele tem no mercado”, afirma o professor Germano Glufke Reis, da Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getulio Vargas (FGV-Eaesp).
Para não afetar a sua reputação – e sua capacidade de atrair talentos – a empresa precisa ser coerente com os seus valores também no ato da demissão. “Se há um distanciamento entre aquilo que a companhia prega e o que ela pratica, a credibilidade, que é o alicerce da marca, ficará severamente comprometida. Os funcionários perderão a confiança na empresa, e isso é muito difícil de resgatar”, diz Ana Luisa de Castro Almeida, diretora do Reputation Institute no Brasil.
* Valor Econômico