Condomínios no azul
Folha de pagamento inflada, inadimplência, desgoverno de materiais, gastos altos com gás, água, luz. As dificuldades de caixa enfrentadas por síndicos e administradores de condomínios têm, quase sempre, causas comuns. O que muda, e pode fazer a diferença, é o tamanho do rombo nas contas e a forma de lidar com o problema. E, cada vez mais, a boa gestão parece ser a solução tanto para sanear contas que simplesmente não fecham, como para adotar práticas mais sustentáveis que ajudem a manter a vida financeira do condomínio em dia.
Um bom exemplo são as mudanças implementadas no condomínio Augusto César Cantinho, em Botafogo. Há sete anos, o prédio tinha uma dívida de R$ 42 mil e funcionários, como seguranças e piscineiros, que trabalhavam sem registro e podiam gerar ações trabalhistas a qualquer momento. A solução veio da então nova síndica, que implementou no condomínio práticas de gestão comuns em empresas.
SEGREDO NÃO ESTÁ NO AUMENTO DA TAXA
— Demiti todos os funcionários sem registro, fazendo acordo com todos. Só nisso, evitamos um gasto de uns R$ 200 mil. Para resolver os problemas de caixa, também revi os contratos de manutenção, que geraram uma economia anual de cerca de R$ 40 mil, e fui buscar uma forma de arrecadar mais — conta Henriette Krutman, a síndica que levou sua experiência de gestora para o prédio e se mantém até hoje no cargo.
E o segredo para arrecadar mais não é o aumento da taxa condominial, mas o fim da inadimplência que, garante ela, é sim uma meta possível. Para realizar o milagre, Henriette bateu de porta em porta, para ter conversas francas e diretas com os inadimplentes. Em alguns casos, chegou até a ajudar a família a organizar suas contas e, assim, poder voltar a pagar o condomínio.
— Quando assumi o condomínio, a situação financeira era catastrófica, com inadimplência altíssima: 12 dos 98 apartamentos estavam sem pagar. Dois deles há mais de um ano. Então, fui ver o que estava acontecendo. E numa das famílias percebi que eles realmente não tinham condições de pagar o condomínio aqui. Então, eles acabaram saindo do prédio — lembra Henriette, que conseguiu fazer com que todos voltassem a pagar a taxa mensal sem precisar entrar com ação judicial.
Já Regina Lúcia Laginestra, ao assumir a administração do condomínio Solar da Barra, em 2010, foi mais radical. Com muitos apartamentos inadimplentes, ela convocou uma assembleia e comunicou: “a partir do terceiro mês sem pagamento, o condomínio vai entrar na Justiça”. Deu certo.
— As pessoas deixam de pagar porque acham que não vai acontecer nada. Quando percebem que aquilo pode gerar um problema, pensam duas vezes — diz Regina Lúcia, que conseguiu tirar o condomínio do vermelho quando um inadimplente resolveu pagar anos de dívidas atrasadas: — A Justiça decretou que o imóvel iria a leilão. Para não perder o apartamento, ele quitou tudo.
Com dinheiro em caixa, fica mais fácil investir em manutenção e adoção de novas práticas, inclusive as que podem ajudar a reduzir gastos. Henriette apostou na troca do sistema de aquecimento de água — de caldeiras a gás para a energia solar. Uma conta que, nos meses de inverno, caiu dos R$ 15 mil mensais (das antigas despesas com gás) para R$ 4 mil. Já Regina apostou na instalação de lâmpadas led, que geraram uma redução de 30% no consumo.
ADMINISTRAÇÃO TRANSPARENTE FAZ COM QUE CONDÔMINOS SE ENVOLVAM NO DIA A DIA DO PRÉDIO
A lista de melhorias inclui ainda ações que acabam por gerar maior interação entre funcionários e moradores e um envolvimento maior de todos no dia a dia do prédio. No condomínio de Botafogo, os funcionários fizeram uma série de cursos, inclusive para saber como lidar com moradores idosos, que ali merecem atenção especial dos funcionários.
Hoje, o condomínio tem uma cadeira de rodas disponível na portaria — que já foi usada por jovens acidentados — e até maca para massagem em um espaço de bem-estar criado numa das áreas comuns. Equipamentos foram doados por moradores. E, no bicicletário, um toque de ordem abriu espaço para mais bicicletas.
— Moro aqui desde criança. Quando você vê uma administração transparente, responsável, acaba se envolvendo mais — diz Carol Arrais, arquiteta que mora no prédio de Botafogo e costuma ajudar, voluntariamente, na organização dos espaços comuns do condomínio e em questões como a autovistoria.
Já na Barra, o bom relacionamento entre moradores e administração levou um dos condôminos a criar uma horta comunitária onde são cultivados temperos e tomate. Tudo liberado, inclusive, para quem quiser levar para casa.
Os dois condomínios investem ainda no cuidado com o lixo, fazendo reciclagem. Na Barra, o material reciclado é vendido, e a renda arrecadada, de R$ 400 mensais, é partilhada entre os funcionários que cuidam da limpeza. Agora, tanto Henriette Krutman como Regina Lúcia já estudam uma nova medida: a adoção da compostagem, técnica que transforma o lixo orgânico em adubo que tanto pode ser vendido como usado nos jardins e plantas dos condomínios.
O Globo