Cheque pré-datado agora tem dia certo. Palavra do STJ
Súmula da Justiça entende que se houver apresentação antes do dia acertado cabe indenização por dano moral e financeiro
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Segurança para o consumidor de que seu cheque não será depositado antes do prazo acertado e o reconhecimento de que o cheque pré-datado é um título de crédito que pode ser aceito tranquilamente pelo fornecedor. É dessa forma que está sendo interpretada a Súmula 370, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), cujos ministros da 2ª Seção entenderam que o cheque pré-datado não pode ser apresentado ao banco antes da data acertada. Se isso ocorrer, cabe indenização por dano moral e financeiro, mesmo que o título tenha sido descontado, porque a conta do consumidor tinha saldo.
“A súmula só veio confirmar o que já era lugar-comum: o cheque pré-datado é uma forma de financiamento”, enfatiza José Antonio Praxedes Neto, vice-presidente da Tele-Cheque, empresa especializada na concessão de crédito no varejo e na verificação e garantia de cheques no País. Tanto que em janeiro representou 79,92% do total de cheques emitidos no Brasil. No ano passado, conforme estimativas do Banco Central, todos os cheques movimentaram R$ 2,232 trilhões;
e os cartões, R$ 387,8 bilhões. Os dados são da TeleCheque. “Com a crise mundial, a oferta de crédito para o consumidor brasileiro foi reduzida, e o cheque é uma opção vantajosa, tanto para o lojista quanto para o consumidor”, observa Praxedes. Com ele, o lojista pode ampliar suas vendas ao oferecer
ao cliente facilidades de prazo e parcelamentos, e o consumidor pode continuar comprando e pagando dentro de suas possibilidades.
Sem contar que o cheque pré-datado é o que menos causa inadimplência, segundo a Pesquisa de Endividamento e Inadimplência do Consumidor, finalizada em fevereiro pela Fecomercio-SP. Nessa amostragem, apenas 2% dos inadim-plentes eram de consumidores que não honraram seus cheques pré-datados. Em contrapartida, 46% dos consumidores que compraram com cartão de crédito deram calote; com carnês, 28%; e com crédito pessoal, 8%. Outro detalhe é que para os comerciantes é mais barato receber com cheque (incluindo o pré-datado) na comparação com as tarifas de cartões de crédito e débito. Lembra Praxedes que só 8% do comércio trabalha com cartões.
“O ministro Fernando Gonçalves foi sábio em seu relato na súmula”, avalia Carlos Alberto Pastor, presidente da Associação Brasileira de Valorização do Cheque (ABVCheque), que trabalha para que esse meio de pagamento ganhe cada vez mais importância. “Com essa súmula, não há mais necessidade de os deputados elaborarem leis para regularizar o pré-datado, uma vez que ela oficializa o parcelamento por meio de cheque e diz a todos os brasileiros que eles podem emitir cheque tranquilamente”, acrescenta.
Cuidado com o repasse – O presidente da Comissão de Defesa do Consumidor da OAB-SP, o advogado José Eduardo Tavolieri de Oliveira, alerta o comerciante de que é preciso tomar cuidado com o repasse do cheque a terceiros, incluindo empresas de factoring. “Se for depositado antecipadamente, o consumidor pode optar se abre ação contra o fornecedor primário, a quem foi transferido o cheque, ou aos dois.” A responsabilidade, pelo Código de Defesa do Consumidor, é solidária.
Antes da súmula, o consumidor só ganhava a ação na Justiça se o cheque fosse devolvido sem fundo, o que lhe acarretava uma série de problemas, como o encerramento da conta-corrente, caso o cheque fosse devolvido duas vezes, além da inclusão de seu nome nas listas de inadimplentes e no Cadastro de Cheques sem Fundos (CCF), do Banco Central. Ou seja, o consumidor era praticamente “expulso” do mercado de consumo.
Lei do cheque – Embora haja agora uma jurisprudência consolidada sobre o depósito antecipado de cheque pré-
datado, a Lei do Cheque (7.357/85) não foi alterada, ou seja, cheque continua sendo um título para pagamento à vista e pode ser depositado a qualquer momento, mesmo que tenha sido pré-datado. Portanto, se for depositado antes da data acordada, não motiva indenização ao emitente.
E as instâncias inferiores da Justiça não foram engessadas com a súmula. Os juízes poderão continuar decidindo com base na Lei do Cheque. “Mas a Súmula 370 vai nortear as decisões das instâncias inferiores, porque, se o processo chegar ao STJ, a decisão será modificada, uma vez que o entendimento da corte é o que está escrito na súmula”, explica Tavolieri.
Projeto de lei – O cheque pré-datado é assunto de projeto de lei na Câmara dos Deputados desde 1978. No momento tramitam 35 propostas para a regulação do assunto. A maioria está apensada ao Projeto de Lei 1029/91 (Fátima Pelaes – ex-PFL, atualmente PMDB/ AP), que propõe nova redação ao artigo 32 da Lei nº 7.357 (a Lei do Cheque), vedando o pagamento de cheque apresentado antes da data de emissão.
Alguns projetos pedem, inclusive, a punição do consumidor, caso do 7354/2002 (José Carlos Coutinho – PFL/RJ, não reeleito), que propõe a modificação da lei ao estabelecer “normas de proteção para utilização do pré-datado, fixando multa de 3 vezes o valor do cheque no caso de dolo ou má-fé na apresentação pelo beneficiário ou para o emitente que tentar frustrar o pagamento”.
Angela Crespo é jornalista especializada em consumo
Fonte: Diário do Comércio