Bitcoin cai 54% em 2022; entenda mudanças no mundo cripto
Saiba a logística por trás dos criptoativos, que possibilitaram o enriquecimento de investidores no mundo digital
As principais criptomoedas registram queda em 2022. A maior delas, o bitcoin, recuou mais de 54% neste ano até 6ª feira (24.jun.2022). O ethereum tombou 67% no mesmo período.
O bitcoin chegou a valer US$ 67.665 na máxima histórica, em 8 de novembro de 2021. Desde então, perdeu 68,6% do valor. Às 17h, a cotação era de US$ 21.222.
O montante total investido no mercado de criptomoedas chegou a US$ 2,9 trilhões em novembro de 2018. Hoje, vale US$ 997 bilhões. O bitcoin responde por 40,7% do valor.
As criptomoedas se comportam de forma diferente dos principais investimentos tradicionais. Mesmo em momentos de nervosismo no mercado financeiro global, os criptos podem registrar alta. E vice-versa.
Nos últimos meses, depois da injeção de estímulos fiscais e monetários nos países, as principais economias mundiais sofreram com o aumento da inflação e, agora, sobem os juros para controlar o avanço dos preços.
O cenário também impacta os ativos digitais. Bernardo Srur, diretor da ABCripto, afirmou que agora há um “certo vínculo” do mercado cripto com o “mais tradicional”.
“Ainda é muito cedo para falar se esse vínculo vai permanecer, ou se algum certo momento vai se descolar. Mas há uma tendência de ambos os mercados mais próximos”, declarou.
Ele afirmou que o cenário atual é atípico. Destacou que o bitcoin sempre esteve sujeito ao cenário econômico mundial, mas que, nos últimos anos, houve uma grande expansão do mercado cripto com a entrada de investidores institucionais.
“A tecnologia está cada vez mais entranhada no mundo financeiro tradicional. […] Nós temos um mercado que cada vez está mais adentrando com uma estrutura. […] A gente tem um mercado que deixou de ser um nicho com essa entrada massiva de pessoas, empresas e investidores institucionais”, afirmou.
CONTEXTO MACROECONÔMICO
Assim como a Bolsa de Valores, os criptoativos registram correções –momentos de queda depois de um longo período de valorização. Bernardo Srur, diretor da ABCripto, falou que o movimento é natural e o contexto macroeconômico é adverso.
Disse, porém, que as correções foram realizadas em diversos momentos da vida útil do bitcoin, por exemplo. Mas os criptoativos, em sua história, sempre valorizaram posteriormente às correções.
Léo Jaguaribe disse que, quanto menor a liquidez e a disposição ao risco dos investidores, os criptoativos tendem a sentir com mais intensidade.
“O aumento dos juros no mercado norte-americano freia o apetite pelo risco, os investidores buscam portos mais seguros para investir nesses momentos”, disse. “São nesses momentos de ciclo de baixa que se encontram as melhores oportunidades para se expor nesse mercado”, completou.
Jaguaribe disse que o mercado de bitcoin criou uma conexão com o S&P 500, o índice da Bolsa de Valores de Nova York.
“Desde janeiro de 2022, o mercado cripto correlacionou com o principal índice mundial de uma forma até então nunca vista. Essa correlação chega a 0,91% no máximo de 1,00%, que é uma correlação perfeita”, disse.
Segundo ele, os investidores institucionais do mundo são basicamente americanos, e como eles lêem esse mercado com uma “pimenta” a mais que o mercado financeiro tradicional, eles trabalham alinhados, variando de forma parecida, mudando apenas a amplitude dessa variação.
O analista afirmou que os criptoativos sempre terão interferência global, porque são negociados por pessoas que vivem dentro das economias locais e sentem os resultados de políticas econômicas.
Mas o estrategista-chefe da Cripto Holder Research disse que, quanto maior for a descrença das pessoas com o sistema financeiro tradicional, mais o mercado cripto ganha força com o tempo.
“Muitos acham isso de extrema importância, haja vista os problemas que já vivemos como confisco da poupança, limitação de saques bancários, ou até proibição de envio de recursos para o exterior. Agora o que tem acontecido é que os institucionais (grandes investidores) estão entrando com cada vez mais intensidade”, disse Jaguaribe.
Fabrício Tota, diretor do Mercado Bitcoin, defendeu que retorno que deveria ser perseguido em criptoativos não está baseado na taxa de juros, e, sim, para multiplicar capital. Mas que a política monetária mais contracionista atrapalha para a entrada de investimentos em ativos de risco, como as criptomoedas.
“Ninguém coloca dinheiro em bitcoin para ganhar 25% ou 30% ao ano. Coloca para multiplicar em 1, 2 ou 3 vezes em 2 ou 3 anos. É uma outra dinâmica. […] Mas quando você pensa em decisões inflacionárias com caminhões de dinheiro, […] a pessoa pode colocar em títulos públicos seguros com 13% ou 14% ao ano. Por que colocaria o ativo em risco?”, questionou o diretor do Mercado Bitcoin.
MERCADO CRIPTO ESTÁ EM RISCO?
Os analistas descartam que o mercado corra o risco de cair ao ponto de ser esquecido. Srur disse que a tecnologia está “entranhada” na sociedade, tanto que bancos centrais dos países estudam formais de criar moedas digitais oficiais, como é o caso do Brasil.
“Apesar da queda, esse risco não existe. O mercado de criptoativos já tem o seu espaço e cada vez mais estamos falando da expansão da sua tecnologia em utilização. Isso independe do valor do bitcoin em si”, declarou o diretor da ABCripto.
Os ativos digitais fazem parte da estratégia de investimentos de muitas pessoas e empresas. O bitcoin, por exemplo, já foi mais relevante no mundo de criptoativos. Tem espaço menor, mas ainda responde por quase 50% da capitalização.
“Ainda não é possível aferir se o bitcoin vai continuar nessa tendência de ser a principal criptomoeda. Hoje, é a cripto que já foi a mais testada e utilizada ampla no mundo, dado que é a mais antiga”, afirmou.
Léo Jaguaribe, estrategista-chefe da Cripto Holder Research, disse que é improvável o mercado cripto cair ao ponto de ser esquecido.
Segundo ele, a próxima geração de bilionários, que são as pessoas de 35 anos para baixo, têm uma adesão muito maior com o mercado.
“Precisamos entender os ciclos longos do mercado e eles vêm do crescimento populacional e as gerações que são e serão as mais ricas, mais influentes e mais espelhadas. Vemos que nesse aspecto, tanto social quanto tecnológico, o que vamos ver é o efeito contrário”, disse.
Ele disse que dados da B3 mostram que em torno de 4 milhões de pessoas investem na Bolsa Brasileira. Já por dados da Binance, mais de 10 milhões de brasileiros investem em criptoativos.
“Nosso mercado possui mais gente, mais nova, com mais disposição ao risco, porém com baixo conhecimento, onde entra toda a educação financeira que adaptada do mercado tradicional, segue os mesmos pilares de análise, de uma forma muito mais complexa e dinâmica que atualmente dos ativos tradicionais”, afirmou.
ENTENDA AS CRIPTOMOEDAS
As criptomoedas são negociadas na internet em uma rede própria blockchain, que é uma plataforma de dados onde são registradas as transações entre os participantes da rede.
O sistema é descentralizado e aberto. Ou seja, a contabilização é feita em diversos computadores –ou mineradores– e as informações são públicas, mesmo que haja um anonimato de dados.
Cada pessoa armazena as criptomoedas em carteiras digitais, onde é possível transferir e acessar os ativos. A tecnologia blockchain permite rastrear cada negociação de criptoativos em “corrente de blocos”. O sistema pode ser usado em outras categorias que não as criptomoedas, como validação de documentos, transações financeiras e outros.
O sistema de pagamento digital não depende de bancos para confirmar a transação.
Diferente dos ativos convencionais, como ações ofertados na B3 (Bolsa de Valores de São Paulo), as criptomoedas têm 3 formas de negociação:
- compra e venda de exchanges;
- mesas de operação OTC (Over The Counter);
- peer-to-peer (transação entre pessoas).
Nos criptoativos, as pessoas não ficam “restritos” à custódia e negociação de uma empresa. “Você pode transferi-los para outra empresa, custodiar em uma outra empresa ou na sua própria carteira. E pode transferir ao redor do mundo”, disse Bernardo Srur, diretor da ABCripto.
A Bolsa de Valores funciona em dias úteis e dentro do mercado comercial. Já as criptos são negociadas em qualquer horário.
O bitcoin também tem a logística de mineração –que é um método de gravar informações da tecnologia blockchain. Os mineradores são remunerados pela tarefa.
A blockchain agrega criptografia, descentralização e sistema de mineradores com o foco em criar registros contábeis transparentes, numa cadeia sequencial de blocos, sem a possibilidade de gasto duplo.
O que protege o anonimato é apenas o endereço de transação, que serve como um email, só para enviar e receber criptoativos.
Léo Jaguaribe, estrategista-chefe da Cripto Holder Research, disse que o mercado cripto é o que mais se aproxima de um sistema liberal completo.
“O próprio mercado se ajusta, sem a interferência nenhuma de governos. Isso tem o lado bom e ruim. O lado ruim é que se o investidor não for muito mais precavido com seus investimentos, ele tende a perder muito mais fácil do que com outro investimento do mercado tradicional”, disse.
Segundo o analista, como não há regulação, qualquer pessoa pode criar uma nova criptomoeda e oferecer ao mercado.
Do lado positivo, há uma independência para negociar qualquer tipo desses ativos no mundo em poucos segundos.
“Você não precisa de autorização ou processos extremamente burocráticos para movimentar sua riqueza. A liquidez hoje do mercado cripto é grande, principalmente nas principais exchanges do mercado, garantindo um fluxo de negociação constante, a qualquer hora. […] Ninguém consegue interceder diretamente na sua carteira e bloquear seus ativos. Toda liberdade tem um custo alto”, afirmou Jaguaribe.
REGULAMENTAÇÃO DE CRIPTOS
Bernardo Srur, diretor da ABCripto, vê como “muito positiva” a regulamentação do mercado. O plenário do Senado aprovou em 26 de abril a regulamentação das criptomoedas. O texto, que agora está em análise da Câmara dos Deputados, é o substitutivo apresentado pelo relator, o senador Irajá (PSD-TO), ao PL 4.401/2021.
A proposta traz diretrizes para a “prestação de serviços de ativos virtuais” e regulamenta o funcionamento das empresas prestadoras desses serviços.
O texto foi aperfeiçoado no Senado, segundo o diretor da ABCripto. “É um projeto de lei muito equilibrado, que traz regras voltadas à segregação patrimonial para garantir que o patrimônio do cliente não se funde com o da empresa”, disse. “Mesmo que a empresa quebre, o patrimônio da pessoa não vai junto com a empresa”, completou.
Fabrício Tota, diretor de novos negócios do Mercado Bitcoin, disse que, apesar da independência do bitcoin, as pessoas são dependentes das moedas fiduciárias. Avalia que em 3 ou 5 anos, o cenário pode mudar. Segundo ele, é preciso fazer legislação que garanta a confiabilidade do mercado.
“Assim como no Brasil, os governos estão preocupados de que precisam de ordenamento, mas não acredito ainda que seja algo como um risco sistêmico ao sistema financeiro. É mais uma legitimação e ordenamento dos prestadores de serviços, do que pode ou não pode, o que é uma corretora e encontrar o papel de cada um”, disse.
Léo Jaguaribe disse que o bitcoin nasceu com a proposta de ser um ativo libertário e ausente de qualquer regulação e instituição governamental. Mas entende que o sistema se sente “ameaçado” com essa estrutura e é questão de tempo para aumentar o controle sobre esses ativos.
“Isso pode ser de certa forma saudável para os investimentos, pois as pessoas terão mais confiança e os próprios institucionais poderão entrar com uma parcela maior de capital pela segurança jurídica que isso pode criar. […] Devido a todos esses problemas, é praticamente impositivo que uma regulação tente pelo menos tornar o ambiente mais saudável e seguro para todos os investidores”, disse.
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