Ações trabalhistas caem 33% em Santa Catarina
A reforma trabalhista completou neste domingo um ano de mudanças nas relações entre patrões e empregados no país, com reflexo direto nos casos levados à Justiça do Trabalho: de janeiro a setembro, as varas trabalhistas de todo o Brasil receberam 36% menos ações em relação ao mesmo período do ano passado. Em Santa Catarina, a queda foi de 33% de janeiro a outubro ante o mesmo período de 2017. Blumenau teve redução de 45% no número de processos trabalhistas, enquanto a Capital registrou baixa de 23% e Joinville teve queda próxima da média do Estado, com 35% (veja gráfico no fim do texto).
Embora a demanda judicial tenha sido menor nos últimos meses, o quadro tem interpretações diferentes. De um lado, representantes de entidades de classe entendem que a reforma aproximou as relações entre trabalhador e empresa, o que teria refletido em menos processos. Do outro lado, lideranças sindicais defendem que o menor volume de ações é consequência de direitos revogados dos empregados.
Juristas ouvidos pela reportagem apontam que, na prática, os trabalhadores passaram a considerar com mais cautela a possibilidade de acionar a Justiça. Isto porque as novas regras determinam que o funcionário terá de pagar os honorários periciais e advocatícios da parte contrária se não ganhar a causa.
– Naqueles pedidos em que havia uma dúvida, mas não era de má-fé, a parte mesmo assim formulava porque não teria nada a perder. Desde a reforma, isto passa a ser considerado. Esse elemento influencia muito no número de ações e pedidos – analisa o juiz Marcel Higuchi, magistrado auxiliar da presidência do Tribunal Regional do Trabalho em SC.
Dados do tribunal apontam que, na contramão dos volume total de processos, as ações de rito sumaríssimo (até 40 salários mínimos) aumentaram 145% após a reforma. Essa projeção ocorre porque, caso perca a reivindicação na Justiça, o trabalhador tem que pagar um percentual de 5% a 15% do que pediu o advogado da empresa, o que explica a maior concentração de ações de menor valor.
A tendência é de que novos casos só sejam levados à Justiça quando o funcionário tiver convicção de que pode comprovar um direito desrespeitado, diz a juíza Andrea Cristina de Souza Haus Bunn, presidente da Associação dos Magistrados do Trabalho da 12ª Região (Amatra 12).
Na avaliação da magistrada, a reforma provocou uma inversão de cenários. Antes, era comum que ações fossem ajuizadas com pedidos abrangentes, às vezes sem sustentação. Agora, o que se percebe são cobranças pontuais de trabalhadores preocupados em não ter que arcar com custos do processo.
– O excesso de pedidos que se fazia, muitas vezes sem fundamento, gerou esse extremo de agora. Não se chegou em um meio-termo – analisa a juíza.
Campo reduzido para advogados
O recuo das ações na Justiça do Trabalho também reduziu o campo de atuação dos advogados. O advogado integrante da Associação Catarinense dos Advogados Trabalhistas de SC e conselheiro da OAB/SC, Gustavo Villar Guimarães, diz que a classe foi uma das mais prejudicadas pelas mudanças. Pontualmente, avalia Guimarães, apenas empresas já colheram benefícios das mudanças, com maior facilidade de contratação. Mesmo que a Justiça Trabalhista tenha recuperado fôlego com a baixa de processos, o advogado não garante previsão muito otimista.
– A Justiça do Trabalho tinha um volume de ações incompatível com uma sociedade salutar, num ambiente econômico. Os números hoje são um pouco mais compatíveis, mas há muita indefinição e esta eleição presidencial torna o futuro ainda mais incerto – avalia.
Sindicatos têm orçamento comprometido
Entre as lideranças sindicais do Estado, é consenso a posição crítica em relação às consequências da reforma na arrecadação dos sindicatos e nas relações de trabalho. A presidente da Central Única dos Trabalhadores em Santa Catarina, Anna Julia Rodrigues, diz que a entidade sempre se colocou contra o imposto sindical obrigatório, mas também reprova a extinção da cobrança sem uma possibilidade de substituição.
Embora reconheça que os sindicatos tiveram um corte significativo da receita sem o imposto sindical, Anna Julia diz que as entidades ainda contam com a colaboração de filiados e não estão fadadas a desaparecer.
—Todos os sindicatos ligados à Central têm seus quadros de filiados que contribuem pela sua liberdade de participação — reforça.
Já o presidente da Força Sindical de Santa Catarina, Osvaldo Olavio Mafra, descreve um cenário mais penoso para os sindicatos. Hoje, diz ele, 90% passam por situação “melancólica”. Dúvidas em relação à lei, acrescenta Mafra, também têm levado as empresas a não descontar em folha as contribuições aprovadas em assembleias. Passado um ano da reforma, o sindicalista também critica a propaganda oficial do governo, que anunciava mais empregos no país.
—Isto não se comprovou na prática. Ao contrário, continuou a escalada do desemprego — diz.
Em Santa Catarina, o saldo de empregos foi positivo entre janeiro e abril, com retração de vagas entre maio e julho. Nos últimos meses de agosto e setembro, o Estado voltou a abrir vagas.
Empresários comemoram mais liberdade de negociação
A maior liberdade de negociação com os trabalhadores, que em casos de acordo pode ter mais força do que a própria legislação, é um ponto comemorado por quem está na ponta da geração de empregos. Entidades empresariais de Santa Catarina defendem que a reforma trouxe mais segurança jurídica ao empregador e maior cobertura ao empregado nos casos em que se conseguiu deixar a informalidade.
—Houve uma liberdade maior com relação à discussão dos itens da pauta entre empregado e empregador. O governo não está interferindo tanto quanto interferia no ano passado. Quem conhece as dificuldades é o laboral e o patronal, não o governo — destaca o presidente da Federação do Comércio de Bens, Serviço e Turismo de SC (Fecomércio), Bruno Breithaupt.
Por outro lado, as entidades patronais também dizem ter sofrido financeiramente com o fim do imposto sindical.
—Tivemos que reformular nossos orçamentos, rever contratos de prestação de serviço, rever nosso quadro de funcionários. Sem dúvida, tivemos que procurar enxugar o máximo possível e assim vamos nos manter — destaca Breithaupt.
Em relação à criação de empregos, no meio empresarial o entendimento é de que apenas a reforma trabalhista não basta para impulsionar as contratações no país. Para o presidente da Câmara de Relações Trabalhistas da Federação das Indústrias do Estado de SC (Fiesc), Durval Marcatto Junior, a abertura de vagas está condicionada ao crescimento da economia e a outras reformas.
—Na medida em que aquelas reformas necessárias para o país sejam feitas, e com isso a economia volte a crescer, todos nós vamos colher os benefícios desta modernização da legislação trabalhista no tocante à formalização dos postos de trabalho— avalia.
Fonte: Diário Catarinense