O Brasil é pouco empreendedor
Muitos conhecem o estudo GEM (Global Entrepreneurship Monitor), realizado por um consórcio de universidades que inclui a Babson College e a London Business School. O estudo mede a taxa de atividade empreendedora em diversos países e é amplamente divulgado pela imprensa todos os anos. Neste estudo, o Brasil aparece como um dos países mais empreendedores do mundo.
Poucos, entretanto, conhecem o GEI (Global Entrepreneurship Index), realizado pelo Global Entrepreneurship and Development Institute, sediado em Washington, EUA. Ao contrário do GEM, cuja metodologia é baseada em 2.000 entrevistas em cada país pesquisado, o GEI usa primordialmente fontes secundárias de informação de cada país, como dados econômicos e de infraestrutura. Na edição 2015 deste estudo, o Brasil aparece em uma posição nada favorável, a 100ª posição entre 130 países.
Ficamos atrás de países como Gabão, Ruanda e Líbia. Na América Latina, perdemos para Nicarágua e El Salvador, e estamos à frente apenas de Guatemala, Suriname e Venezuela. As primeiras posições são ocupadas por Estados Unidos, Canadá e Austrália. Na América Latina, o destaque fica com o Chile, na 19ª posição, e a Colômbia, em 36º lugar. O relatório completo pode ser obtido em www.thegedi.org.
O que explica posição tão ruim? A metodologia explora 14 pilares do ecossistema empreendedor de cada país, agrupados em três temas: Atitude, Habilidade e Aspirações. O pais se destaca positivamente em Atitude, situando-se na 49ª posição e com ampla vantagem em oferta de oportunidades de negócio, talvez nosso principal motor da atividade empreendedora. Junto com o fator competitividade e rede de contatos, temos os três principais pontos que favorecem o empreendedorismo aqui.
Não é difícil explicar estes fatores. O Brasil é uma economia em expansão, embora os indicadores econômicos indiquem o contrário. Há tudo por fazer aqui, oportunidades por todos os lados e com poucas empresas explorando esse enorme potencial. A facilidade de construir relacionamentos é um traço cultural do brasileiro, que minimiza os efeitos contrários das dificuldades e barreiras existentes.
Por outro lado, os piores índices estão nos grupos Habilidade e Aspirações. Em Habilidades, o ponto negativo é a qualidade do capital humano. Com nota 1,5 de um total de 10 pontos, temos colhido constantemente os frutos do descaso histórico com a educação em todos os níveis. Não por acaso, estudos acadêmicos comprovam essa falha, quando os empresários citam a falta de mão de obra qualificada como principal entrave para o crescimento dos seus negócios.
O grupo Aspirações consegue ser ainda pior. Nesse conjunto de atributos, ficamos com a penúltima posição entre os 130 países. E aqui vemos nossos principais defeitos: inovação de produto (nota zero), inovação de processos (nota 0,8) e internacionalização (nota 0,1), vergonhoso! Outros estudos corroboram esse resultado. Pode parecer uma contradição: afinal, como podem existir tantas oportunidades em um país em que os negócios não geram inovações?
A explicação está na natureza dessas oportunidades. Países com economia estabilizada crescem a partir da geração de novas demandas, e são as novas tecnologias que possuem maior potencial de desenvolver novos mercados. Países que vivem uma fase de desenvolvimento como o Brasil ainda buscam atender demandas reprimidas. Assim, quando surge um bairro novo em uma cidade, por exemplo, vem a necessidade de padarias, restaurantes, sapatarias, postos de gasolina e outras demandas de produtos e serviços que não existiam antes. Mas esses tipos de negócios não precisam gerar inovações – eles sobrevivem e alguns prosperam simplesmente atendendo demandas existentes. Para alguns estudiosos, a identificação de novos mercados não deixa de ser inovação, mas está fora dos critérios de inovação do GEI.
A inovação de produtos e processos não é uma realidade no Brasil, e dificilmente será no curto prazo. Se o empreendedor nascente pode desenvolver um negócio só atendendo a demanda existente, por meio de um negócio tradicional, onde existem poucos concorrentes, para que se arriscar levando um produto diferente, ou ainda explorar o mercado internacional? Em um ambiente hostil para novos negócios como é o Brasil, reduzir riscos é fator chave para a sobrevivência.
Por isso, o Brasil não é uma nação de empreendedores, e sim de donos de pequenos negócios. Pode ser difícil admitir, mas o relatório GEI reflete mais a dura realidade empreendedora brasileira do que o GEM.
Marcos Hashimoto é Coordenador do Centro de Empreendedorismo da Faap, consultor e palestrante.