CPRB – Regulamentação e Pontos Polêmicos
Após as alterações introduzidas pela MP n. 563, convertida na Lei n. 12.715/2012, e pela MP n. 582/2012, ainda não convertida em lei, foi publicado o Decreto n. 7.828/2012, regulamentando as regras para incidência da Contribuição Previdenciária sobre a Receita Bruta (CPRB) e retenção do INSS, previstas na Lei n. 12.546/2011, que trata do Plano Brasil Maior (PBM).
A regulamentação tem seu mérito, na medida em que melhor sistematiza as normas vigentes sobre a matéria, e esclarece o posicionamento oficial do governo acerca de alguns temas.
Nesse sentido, pode-se destacar a disciplina dos seguintes pontos:
a) o rol dos serviços de Tecnologia da Informação (TI) e Tecnologia da Informação e Comunicação (TIC);
b) as vigências das alíquotas e dos setores contemplados pela desoneração;
c) a aplicação, a partir de 01/08/2012, da retenção de 3,5% sobre o valor bruto da nota fiscal ou fatura de prestação de serviços, no caso de contratação de empresas para execução dos serviços de TI, TIC, hotelaria, call center e de concepção desenvolvimento ou projetos de serviços integrados;
d) a confirmação de que as novas regras aplicam-se apenas aos produtos industrializados pela empresa, considerando-se para tanto os conceitos de industrialização e industrialização por encomenda do Regulamento do IPI, admitindo-se a desoneração inclusive das empresas que executam industrialização por encomenda parcial (etapas do processo), desde que de suas operações resulte produto abrangido pela nova sistemática de recolhimento;
e) o posicionamento oficial do governo no sentido da aplicação obrigatória da Contribuição Previdenciária sobre Receita Bruta (CPRB) e sua forma de apuração, centralizada no estabelecimento matriz da empresa, com a exclusão: e.1) das receitas brutas de exportação; e.2) das vendas canceladas e dos descontos incondicionais concedidos; e.3) do IPI, quando incluído na receita bruta; e, e.4) do ICMS ? Substituição Tributária.
f) o cálculo proporcional a ser aplicado para as empresas que desenvolvam outras atividades além das desoneradas, com a definição de que nos meses em que houver faturamento exclusivo de produtos não sujeitos à CPRB deverá haver o recolhimento integral das contribuições sobre a folha, além do esclarecimento de que as empresas que tenham faturamento exclusivo de produtos sujeitos à CPRB não precisarão recolher as contribuições sobre a folha nos meses em que não auferirem faturamento;
g) a dispensa da proporcionalidade para as empresas que tenham mais de 95% de seu faturamento de produtos e serviços sujeitos à nova sistemática, e a dispensa da CPRB para as empresas cujo faturamento de produtos e serviços sujeitos à nova sistemática sejam inferior a 5% de seu faturamento;
h) a incidência da contribuição previdenciária patronal sobre o 13º salário, a ser calculada de forma proporcional em relação aos períodos anteriores à tributação da empresa pela CPRB, bem como o esclarecimento do cálculo para as empresas que possuem receitas sujeitas e não sujeitas à nova sistemática, devendo-se considerar para essa finalidade a receita bruta acumulada nos doze meses anteriores ao mês ao mês de dezembro de cada ano-calendário.
Para mais informações, recomenda-se a leitura do Decreto nº 7.828/2012.
A despeito da regulamentação, cabe chamar atenção para algumas questões ainda pendentes de aperfeiçoamento e outras polêmicas, a saber:
a) devoluções de mercadorias:
Apesar da omissão da legislação, a Receita Federal já respondeu à consulta fiscal admitindo a exclusão do cálculo da receita bruta das devoluções de mercadorias, equiparando-as às vendas canceladas (Processo de Consulta n. 121/2012, SRRF 10a RF, DOU 13/09/2012).
b) estabelecimentos filiais com atividades comerciais e receitas exclusivamente de revendas:
Em linha ao que consta na legislação, no sentido de que a apuração das contribuições deve ser feita de forma centralizada pelo estabelecimento matriz, esclareceu a Receita Federal, também em resposta à consulta fiscal, que quando o contribuinte possuir estabelecimento matriz com atividade industrial e estabelecimentos filiais com atividades comerciais, ainda que exclusivas, na base de cálculo da CPRB deverá ser incluída a receita das filiais (Processo de Consulta n. 45/2012, SRRF 4a RF, DOU 23/07/2012).
Não ficou claro nesta última hipótese a necessidade ou não de se fazer o cálculo da proporcionalidade entre receitas sujeitas e não sujeitas. Considerando-se, no entanto, a equiparação dos estabelecimentos filiais, neste caso, a industriais, aparentemente, o entendimento foi no sentido de que deve ser incluído a receita das filiais no faturamento e tributadas as mesmas como se fossem decorrentes de vendas de produtos industrializados, não se fazendo a proporcionalidade. Os contribuintes que se enquadram nessa situação devem ficar atentos, e se for o caso solicitar esclarecimentos complementares à Receita Federal.
Ressalta-se que as soluções só têm efeito legal para quem fez a consulta, mas servem como precedentes para orientarem as ações dos fiscais e demais contribuintes.
c) exportações realizadas via tradings e comerciais exportadoras:
Outro ponto omisso diz respeito às exportações realizadas por intermédio de tradings e comerciais exportadoras. A legislação estabelece à exclusão dessas receitas para fins de cálculo das Contribuições Previdenciárias sobre Receita Bruta (CPRB), mas nada fala sobre as vendas realizadas via tradings e comerciais exportadoras.
A própria Lei n. 12.546/2011, ao instituir o Regime Especial de Reintegração de Valores Tributários para as Empresas Exportadoras (REINTEGRA) deixou claro que as vendas ao exterior efetuadas através de tradings e comerciais exportadoras também permitem a fruição dos créditos outorgados por meio deste regime. Contudo, foi omissa quanto à inclusão ou não destas vendas na exoneração do cálculo da CPRB.
Atentando-se à literalidade da norma, essa omissão poderá ser interpretada como ausência de permissão para a exclusão das exportações feitas via tradings e comerciais exportadoras. Não obstante, uma interpretação sistemática do ordenamento, em especial do comando emanado do art. 149, § 2º, da Constituição Federal de 1988, permite conclusão diversa, favorável aos contribuintes.
Na dúvida, este é mais um tema que remanesce como polêmico, ao qual as empresas exportadoras devem ficar atentas, recomendando-se a realização de consulta fiscal, haja vista a inexistência de qualquer pronunciamento oficial a propósito.
d) obrigatoriedade da nova sistemática:
Em que pese a regulamentação publicada ter estabelecido a obrigatoriedade da nova sistemática, é possível defender que esse posicionamento a vicia inconstitucionalidade, uma vez que não está sendo respeitado o princípio da não-cumulatividade, em ofensa ao preceituado no art. 195, inc. I, letra “a”, cumulado com seus §§ 12 e 13, da Constituição Federal de 1988.
Afora isso, a manutenção da obrigatoriedade, principalmente para as empresas que tiveram sua carga tributária majorada em função disso, vai de encontro aos objetivos do Plano Brasil Maior, criando condições de concorrência desiguais para contribuintes que se encontram em situação equivalente, desrespeitando-se, assim, os princípios da capacidade contributiva e da isonomia tributária (CF/88, arts. 145, § 1o, e 150, inc. II).
Como é sabido, sendo as finalidades das novas normas justamente reduzir o peso dos tributos incidentes sobre a folha de pagamento, desonerando os setores que mais geram empregos e que mais estão suscetíveis de serem afetados pela crise financeira internacional, qualquer interpretação no sentido de ser o novo regime obrigatório, independentemente de os novos valores apurados serem menores ou maiores do que os da sistemática anterior, implicará no desvirtuamento de suas finalidades originais.
A fim de se evitar esses vícios, defende-se que a nova legislação deve ser interpretada em conformidade com os ditames maiores de nosso ordenamento jurídico, previstos na Constituição Federal e na exposição de motivos do Plano Brasil Maior, de sorte a se admitir que a sujeição ou não ao novo regime de recolhimento das contribuições previdenciárias seja facultativo, podendo ser exercido ou não por opção do contribuinte, tal como ocorre com a opção pelo lucro real e lucro presumido para fins de aferição do imposto de renda.
Tendo em vista o conteúdo da regulamentação expedida, contudo, e enquanto não modificada a legislação de regência, deve-se procurar o Poder Judiciário para fazer valer esse direito.
e) incidência proporcional da contribuição patronal sobre o 13o salário:
Observa-se que o Decreto n. 7.828/2012, em consonância com as alterações trazidas à Lei n. 12.546/2011 pela MP n. 563, convertida na Lei n. 12.715/2012, estabeleceu que relativamente aos períodos anteriores à tributação da empresa pela CPRB, mantém-se a incidência das contribuições sobre a folha de salários, aplicada de forma proporcional sobre o 13o (décimo terceiro) salário, bem como que, para fins de cálculo da proporcionalidade, no caso de receitas sujeitas e não sujeitas à nova sistemática, deverá ser considerada a receita bruta acumulada nos 12 (doze) meses anteriores ao mês de dezembro de cada ano-calendário.
Anteriormente às alterações legislativas acima, essa cobrança estava prevista no Ato Declaratório Interpretativo RFB n. 42/2011, de sorte que para as empresas que ingressaram no regime das CPRB já na competência de dezembro de 2011 essa exigência pode ser questionada na justiça, por ofensa ao princípio da estrita legalidade tributária.
Entretanto, até mesmo as mudanças legislativas posteriores, ainda que previstas em lei, podem vir a ser questionadas. Acontece que, sob o ponto de vista tributário/previdenciário, e não trabalhista, a incidência da contribuição sobre o 13º salário nasce somente em um momento, qual seja, em 20 de dezembro de cada ano.
Isso é o que está expresso no art. 7o, da Lei n. 8.620/93, de sorte que o argumento da Receita Federal, no sentido de que o fato gerador da contribuição previdenciária sobre o 13o salário ocorre mês a mês não encontra suporte na legislação e igualmente pode ser questionado perante o Poder Judiciário.
f) condenações proferidas no âmbito da Justiça do Trabalho:
Uma última questão que ainda tem sido negligenciada, concerne em se definir se as empresas sujeitas à sistemática da CPRB, total ou parcialmente, devem efetuar o pagamento das contribuições previdenciárias sobre as remunerações decorrentes de condenações ou acordos firmados perante a Justiça do Trabalho.
Para se responder a esta indagação, deve-se ter em vista que o art. 114, inc. VIII, da CF/88, ao estabelecer a competência da Justiça do Trabalho para processar e julgar a execução, de ofício, das contribuições sociais decorrentes das sentenças que proferir, o fez, exclusivamente, em relação às contribuições previstas em seu art. 195, inc. I, letra ?a?, e inc. II.
A competência da Justiça do Trabalho, portanto, está restrita às contribuições devidas pelos empregadores, empresas e equiparados, incidentes sobre a folha de salários e demais rendimentos pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoa física que preste serviços, mesmo sem vínculo empregatício (CF/88, art. 195, inc. I, letra ?a?), e também às contribuições devidas pelos trabalhadores e demais segurados da previdência social (CF/88, art. 195, inc. II).
As contribuições incidentes sobre a receita bruta, em substituição às contribuições acima mencionadas, têm suporte constitucional no art. 195, e seus §§ 12 e 13, da CF/88, não podendo ser abrangidas pelas execuções proferidas no âmbito da Justiça Laboral, até mesmo porque estão fora de seu campo de incidência (não há base imponível).
Ainda quedam-se controvertidos, no entanto, as condenações ou acordos referentes a verbas e períodos anteriores à sujeição da empresa à nova sistemática, bem como as condenações sofridas e acordos feitos por empresas incluídas no regime das CPRB apenas parcialmente.
Todas essas situações, como é de se esperar, haverão de amadurecer e serem definidas pelos competentes precedentes administrativos e/ou judiciais, e/ou, ainda, objeto de novas regulamentações legislativas. Nesse meio tempo, cabe aos contribuintes ficarem atentos e zelarem por seus direitos.
* por Luiz Antônio Schramm Carrascoza, advogado