01/04/2009
Entrevista: orientar-se só pelas finanças é um erro
Segundo Claudio Fernández-Aráoz, da Egon Zehnder International, crise proporciona tomada de decisões erradas no âmbito da gestão de pessoas
SÃO PAULO – Há, por trás da atual crise financeira, diversas decisões envolvendo pessoas, desde a seleção equivocada de gestores até a implantação de um sistema de remuneração que em nada estimula a prudência e a ética. Esta é a opinião de Claudio Fernández-Aráoz, sócio da Egon Zehnder International, empresa de recrutamento e avaliação de altos executivos, presente em 37 países.
Em 20007, o argentino lançou “Grande decisões sobre pessoas”, livro que recebeu elogios de nome como Jack Welch, Jim Collins e Daniel Goleman. A obra – que esmiúça as diretrizes relacionadas à gestão dos principais responsáveis pelos resultados corporativos, os indivíduos – acaba de chegar ao Brasil pela DVS Editora (R$ 64, 360 páginas). Nesta entrevista à Gazeta Mercantil, Fernández-Aráoz explica por que as decisões que envolvem pessoas são cada vez mais importantes para os resultados corporativos.
Gazeta Mercantil – A gestão de pessoas é um tema que recebe cada vez mais atenção do mundo corporativo. Por que, então, ainda há tantas decisões equivocadas nesse âmbito?
Vejamos o problema que estamos enfrentando agora. A crise mundial representa um fracasso tanto do ponto de vistas da destruição de riquezas quanto da ética. Podemos perceber duas coisa com as nomeações recentes de altos executivos, principalmente no mercado financeiro. A primeira é que elas são decisivas. As más nomeações provocaram perdas de trilhões de dólares. Ao mesmo tempo, boas escolhas podem gerar ganhos elevados. Mas o que interessa é questionar o que há por trás de escolhas tão equivocadas.
Acredito que elas foram tomadas com base, principalmente, em capacidades técnicas, no coeficiente intelectual, que estão muito relacionadas com a formação acadêmica. Alguém que tenha um MBA em uma das principais escolas de negócio do mundo é um indivíduo com um alto nível de inteligência no sentido tradicional. A seleção, principalmente para instituições financeiras, dão muita importância a esse tipo de capacidade – que são importantes – e deixa de lado outros aspectos muito importantes do candidato. Um deles é a inteligência emocional, isto é, a capacidade de gerenciar a si mesmo e as relações com os demais.
Avaliar a experiência que um executivo possui é razoavelmente fácil. Mas avaliar características como a capacidade de controlar a relação consigo mesmo e com os demais é difícil e requer entrevistas em profundidade, por exemplo. Outro aspecto que não é levado conta são os valores pessoais.
Gazeta Mercantil – Qual é o papel do sistema de bônus nesse quadro?
Esses equívocos foram intensificados por um sistema de incentivos nefasto, baseado em opções de ações, que induzem os gestores a tomarem risco muito elevados, uma vez que essas opções geram ganhos enormes ao executivos se o desempenho da companhia é alto, mas não provocam perdas se os resultados são ruins. É um sistema de incentivos forte e assimétrico e por isso levou muitos a assumirem riscos excessivos. Foi isso que aconteceu: a união de pessoas com valores errados e sem a suficiente fortaleza emocional com um sistema de incentivo perverso.
Gazeta Mercantil – O que faz com que seja tão difícil escolher as pessoas certas?
Isso ocorre por dois motivos. Em primeiro lugar, temos um cérebro velho para um trabalho novo. Nosso cérebro não é muito distinto daquele que o homem primitivo, que vivia 10 mil atrás, possuía. Quando aquele homem encontrava algo que se movia, ele basicamente precisava avaliar se aquilo iria comê-lo ou se era alimento. Era uma decisão relacionada ao impulso de luta ou fuga, algo primitivo, instintivo e instantâneo. Nosso cérebro ainda é fortemente programado desse modo. Essa capacidade de reações superficiais com base em algo que nos agrada ou ameaça está fortemente programada em nós.
O problema é que o mundo mudou. A questão não é mais de ameaça ou atração. É preciso fazer uma análise profunda e investigar quais competências são necessárias para os cargos abertos. O nosso cérebro no prejudica, pois caímos em todo tipo de armadilhas psicológicas que nos levam, por exemplo, a nos rodearmos de pessoas que sejam parecidas conosco, enquanto a fortaleza de uma equipe está na diversidade. O segundo motivo que torna tão difícil a escolha das pessoas certas a existência de um sistema educacional velho, enquanto a economia é moderna.
As pessoas fazem MBAs, passam anos estudando finanças, contabilidade, marketing e estratégia, mas não dedicam tempo para estudar como tomar decisões corretas sobre outras pessoas, quando nada é mais importante para o êxito de um executivo do que escolher os indivíduos corretos. Afinal, quando alguém se torna um gestor, tudo passará a depender da equipe formada. Tudo será realizado por meio dos outros. O resultado, o desempenho, os riscos, tudo dependerá de pessoas. Porém, não estudamos essa questão.
A boa notícia é que a tomada de decisões sobre pessoas não é uma arte. Ela não é uma capacidade que ou você possui ou você não possui. Decidir sobre pessoas é uma disciplina que pode ser aprendida.
Gazeta Mercantil – Como uma companhia deve agir ao selecionar seus executivos?
É preciso seguir um processo que, basicamente, envolve seis passos. Primeiro, é importante decidir quando trocar uma pessoa. De acordo com algumas pesquisas, 90% dos executivos consideram que suas empresas demoram para substituir os indivíduos que se mostram inadequados. Evidentemente, as implicações desse postura são enormes. Não se pode olhar para o desempenho passado de alguém. É preciso olhar para frente: qual é o futuro e quais são as capacidades necessárias enfrentá-lo? Essa pessoa as possui ou não? A partir disso, chega-se na segunda etapa do processo, que é levantar quais características a empresa busca em um candidato.
É difícil generalizar, mas considero a inteligência emocional algo fundamental. A terceira fase é estabelecer onde buscar as pessoas, se na própria organização ou fora dela. Há muitas pesquisa sobre o tema e elas mostram que para uma posição sênior, de alta responsabilidade, a melhor prática é buscar em um universo amplo de candidatos, isso é, tanto fora quanto dentro da empresa. Depois, é necessário avaliar os candidatos adequadamente. Além de saber com clareza qual capacidades se está buscando, é preciso entrevistá-los em profundidade. Não adianta indagar as pessoas sobre seus pontos fortes e fracos, isso não leva a nada. A entrevista deve ser complementada com a verificação de referências.
O quinto passo é atrair e também reter os melhores talentos. Essa é uma etapa muito importante no Brasil, um mercado em crescimento e que, por isso, sofre com a escassez de talentos. A remuneração, claro, precisa ser adequada, mas isso não é o principal fator para atrair os melhores. Estes não se motivarão por dinheiro, mas por desafio. Após encontrar o melhor candidato e atraí-lo, é importante fazer um último esforço para facilitar a integração do candidato na companhia. É preciso preparar os sues primeiros passos, para que ele faça uma aterrissagem suave. É como a reentrada de um módulo lunar na atmosfera terrestre. Se o movimento é brusco, se a cultura da empresa não é levada em consideração, o atrito pode provocar sérios danos.
Fonte: Financial Web
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