Decisões sobre investimento do FSB estão amarradas à gestão fiscal
As decisões de investimentos do Fundo Soberano do Brasil (FSB) estão completamente amarradas à gestão fiscal das contas do governo federal. Dependendo da aplicação financeira escolhida pelo gestor do fundo, o Tesouro Nacional, a operação poderá ter ou não impacto nas contas públicas, influenciando negativamente o resultado do superávit primário do setor público.
A Agência Estado apurou que, na complexa engenharia da contabilidade pública, se o governo resolver, por exemplo, aplicar os recursos depositados no FSB em ações de empresas no Brasil e no exterior, inclusive ADRs (recibos de ações de empresas brasileiras negociados na bolsa de Nova York), a operação será contabilizada como déficit para o cálculo do superávit primário. Mas se, por outro lado, o governo resolver investir o dinheiro no exterior como “funding”, por exemplo, para o Banco do Brasil (BB) e o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico Social (BNDES), a operação é apenas financeira, sem impacto nas contas públicas.
É que o manual com as normas contábeis, utilizado pelo Banco Central (BC) para o cálculo do resultado fiscal do setor público, lista o que pode ser considerado como ativo financeiro ou não financeiro. Títulos públicos brasileiros e de outros países, bônus de empresas, depósitos no exterior em moeda estrangeira são exemplos de ativos financeiros. Investimentos do FSB nesses ativos, portanto, não trazem prejuízo para o superávit primário. Já investimentos em ações ou mesmo em cotas de fundos de investimento que podem comprar ações são considerados ativos não financeiros, com impacto fiscal.
Uma debênture, por exemplo, dependendo ou não das suas características, pode ser contabilizada como um ativo não financeiro. Aplicações em fundos de investimento também podem ter impacto fiscal ou não. Tudo depende da forma como o fundo foi montado. Se o fundo de investimento no seu estatuto tiver autorização para comprar ações, a aplicação de recursos do FSB para a compra de cotas tem impacto fiscal. Foi o que aconteceu quando o governo, no final de 2008, aplicou R$ 14,2 bilhões em títulos públicos no Fundo Fiscal de Investimento e Estabilização (FIEE).
Administrado pelo Banco do Brasil, o FIEE tem como único cotista o FSB, e o seu estatuto permite investimentos em ações. Devido a essa restrição, quando o dinheiro do FSB foi utilizado para a compra de cotas do FIEE, o impacto foi negativo nas contas do governo central.
Caso o governo decida se desfazer das cotas e retornar com os recursos para o FSB, a operação será contabilizada como receita primária, influenciando positivamente as contas. Hoje, o FIEE tem cerca de R$ 16,2 bilhões aplicados em títulos do Tesouro Nacional.
COMPRA DE DÓLARES – As compras de dólar que o FSB eventualmente fizer no futuro no mercado interno serão destinadas à compra de ativos no exterior ou depósitos em bancos lá fora. Como a legislação cambial brasileira não permite depósitos em dólar em contas no Brasil, os recursos em moeda estrangeira adquiridos pelo FSB não poderão ficar no País. Os dólares poderão ficar depositados em conta no exterior, como ativo, ou serem aplicados em outros investimentos. Por isso, mesmo que o Tesouro compre dólares, o impacto nas contas da operação vai depender do destino final da aplicação no exterior.
O Tesouro está concluindo a regulamentação do Conselho Deliberativo do FSB. Formado pelos ministros da Fazenda e Planejamento e pelo presidente do Banco Central, o Conselho será responsável por traçar a estratégia de investimentos do FSB. O governo pode, por lei, repassar para o FSB recursos correspondentes às dotações orçamentárias, inclusive aquelas decorrentes da emissão de títulos da dívida pública e ações de empresas estatais de economia mista. Nesse último caso, o que exceder ao necessário para o controle da União na empresa.
A orientação do Ministro da Fazenda, Guido Mantega, é preparar a regulamentação final do FSB o mais rápido possível. A equipe do Ministério da Fazenda está disposta a utilizar o FSB como um instrumento adicional de controle da volatilidade de câmbio. Esse movimento já foi deixado claro pelo secretário do Tesouro, Arno Augustin, e pelo próprio Mantega. A avaliação é de que, junto com a taxação com IOF do capital externo, a possibilidade de uso do FSB ajudou a conter a valorização do real.
* Agência Estado / publicado no Jornal do Comércio