2017: O Ano das Novidades em Matéria de Terceirização
Você sabe o que significa terceirização?
por: Roberto Pierri Bersch
Em síntese, a terceirização é uma forma de organização estrutural que permite a uma empresa (tomadora dos serviços) transferir à outra (prestadora de serviços) parte ou partes de seu processo produtivo. Via de regra, em qualquer ramo da atividade econômica, quando houver contratação de uma empresa ou organização que forneça trabalhadores para execução de uma determinada atividade em favor de outra empresa ou organização, estar-se-á diante do instituto da terceirização.
Então, a terceirização implica em uma forma de administração e execução de uma atividade empresarial, mediante a contratação de terceiros (não empregados), vinculados a uma empresa especializada naquele ramo de serviços.
Em situações de tal natureza, portanto, haverá uma empresa tomadora, uma empresa prestadora e os trabalhadores diretamente envolvidos em tais atividades, ou seja, aqueles que concretamente executarão os serviços.
No Brasil, até 2017 não havia um regramento formal e explícito sobre terceirização. Existiam apenas algumas previsões legais para situações bastante específicas. Assim, é possível citar, apenas exemplificativamente, as Leis nº 7.102/1983 e 8.987/1995.
A primeira, que dispõe sobre segurança de estabelecimentos financeiros, contempla expressamente no artigo 3º, inciso I, que a vigilância ostensiva e o transporte de valores em favor das instituições financeiras poderão ser executados por empresas especializadas contratadas especificamente para tal fim.
A segunda, que disciplina o regime de concessão e permissão da prestação de serviços públicos, prevê no artigo 25, § 1º, a possibilidade de uma concessionária de serviços públicos “contratar com terceiros o desenvolvimento de atividades inerentes, acessórias ou complementares ao serviço concedido, bem como a implementação de projetos associados.”
Diante deste autêntico vácuo em matéria de legislação, o Tribunal Superior do Trabalho (TST), visando encontrar uma solução para as centenas de milhares de ações sobre terceirização que tramitavam perante a Justiça do Trabalho, editou Súmulas sobre o tema.
A primeira, mais antiga (nº 256, de 1986), simplesmente considerava ilegal a contratação de trabalhadores por empresa interposta. Assim, salvo nas hipóteses de trabalho temporário (que não se confunde com terceirização) e daquelas contratações realizadas na forma da supramencionada nº 7.102/1983, entendia o TST que o vínculo de emprego se formava diretamente entre o trabalhador (terceiro) e a empresa tomadora dos serviços.
Com o passar do tempo e o avanço da terceirização no Brasil, esta previsão da Súmula nº 256 se mostrou ineficiente para a solução dos conflitos de interesses que continuavam a ser apresentados à Justiça do Trabalho, razão pela qual em 1993 o TST editou nova Súmula sobre a matéria (nº 331), que após algum tempo implicou no cancelamento da anterior.
A solução proposta pelo TST através da Súmula nº 331 se mostrava um pouco mais equilibrada: apesar de aquele Tribunal continuar considerando ilegal a contratação de trabalhadores por empresa interposta (com a consequente formação de vínculo de emprego diretamente entre o trabalhador e a tomadora dos serviços), foi reconhecida a possibilidade de contratação de serviços de vigilância, de conservação e limpeza e, finalmente, de serviços especializados ligados à atividade-meio da empresa tomadora de serviços.
Em qualquer destas situações, porém, não poderiam estar presentes a pessoalidade e a subordinação direta, uma vez que tais características são inerentes à relação de emprego e implicariam no reconhecimento de vínculo de tal natureza diretamente entre o trabalhador (terceiro) e a empresa tomadora dos serviços.
Não era uma Súmula do TST, porém, a forma mais adequada de disciplinar a terceirização no Brasil, razão pela qual, projetos de lei passaram a ser debatidos no Congresso Nacional.
Em 2017, um dos projetos em questão (PL 4.302, de 1998), que se encontrava há algum tempo sem movimentação naquela Casa, recebeu súbito e surpreendente impulso, foi aprovado na Câmara dos Deputados e no Senado Federal, sendo logo a seguir sancionado pelo Presidente da República, com alguns vetos.
Foi então publicada a Lei nº 13.429/2017, que alterou algumas regras sobre o trabalho temporário (Lei nº 6.019/1974), mas fundamentalmente passou a disciplinar de forma explícita a terceirização, criando regras sobre contratos de prestação de serviços específicos e determinados.
A novíssima lei prevê: (1) a possibilidade de terceirização e até de quarteirização (subcontratação); (2) exige que o contrato de prestação de serviços seja escrito e para execução de serviços determinados e específicos; (3) não contempla explicitamente, mas também não exclui a terceirização da atividade-fim e (4) estabelece, distintamente do que havia ante de sua publicação, presunção de inexistência de relação de emprego.
Atribuiu ainda o legislador à empresa tomadora dos serviços a responsabilidade pela segurança, higiene e salubridade dos trabalhadores terceirizados e permitiu que esta facultasse a tais trabalhadores os serviços médicos, ambulatoriais e de refeição concedidos aos seus empregados.
A Lei nº 13.429/2017 também reafirmou – mantendo previsão constante da Súmula nº 331, do TST – a responsabilidade subsidiária da tomadora de serviços em caso de não cumprimento, pela empresa prestadora dos serviços, das obrigações legais e contratuais ajustadas com os trabalhadores.
As novidades do ano de 2017 relativamente à terceirização, contudo, não foram apenas estas. Como referido anteriormente, a Lei nº 13.429/2017 não vedava, mas também não havia autorizado explicitamente, a terceirização da atividade-fim. Assim, logo após sua publicação, em março, iniciou-se intensa discussão sobre o tema.
Tal discussão, no entanto, não ultrapassou o mês de julho de 2017. Afinal, com a publicação no Diário Oficial da Lei nº 13.467/2017, que ficou conhecida como a “lei de modernização da legislação trabalhista”, aqueles dispositivos publicados em março e referentes à terceirização foram parcialmente modificados. A principal alteração contemplou exatamente aquilo que os setores empresariais tanto aguardavam: passou a constar expressamente da lei a autorização para terceirização da atividade-fim, desde que delegada à “prestadora de serviços que possua capacidade econômica compatível com a sua execução.”
Foram também assegurados aos trabalhadores alguns direitos adicionais, principalmente relacionados a salários e benefícios, mas este é um tema a ser abordado em outra oportunidade.
Por enquanto, portanto, além de destacar que 2017 foi um ano realmente surpreendente em matéria de avanço da legislação sobre terceirização no Brasil, resta avaliar com muita cautela se a terceirização da atividade-fim é realmente interessante e recomendável para o desenvolvimento do seu negócio e aguardar como estas novas previsões legais serão recebidas e interpretadas pelo Poder Judiciário.
- O autor é advogado, sócio de TozziniFreire Advogados