Crise política afeta economia em 2018, com juros caindo menos e dólar mais alto
A crise política que abala o governo Michel Temer vai afetar de maneira mais intensa o desempenho econômico do Brasil em 2018, com crescimento mais fraco do que o esperado, basicamente por causa da expectativa de dólar mais caro e queda menor dos juros.
E esse cenário, segundo analistas ouvidos pela ‘Reuters’, vai impactar praticamente todos os setores, como indústria, serviços e até investimentos, essencial para impulsionar a economia.
“O processo de recuperação da economia brasileira será lento e não ocorrerá na velocidade esperada”, afirmou o pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia, da Fundação Getúlio Vargas (Ibre/FGV), Julio Mereb, para quem o Produto Interno Bruto (PIB) vai crescer 1,8% em 2018, abaixo da estimativa anterior de 2,5 por cento.
No cenário de mais pessimismo traçado pelo Ibre, no ano que vem, a expansão da indústria será de 2,4% e de serviços, de 1,2%. Até então, as previsões eram de crescimento de 2,8 e 1,8%, respectivamente.
A crise política eclodiu em meados de maio, após Temer ser atingido pela delação de executivos do grupo J&F e que acabou levando-o a ser investigado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) por crime, entre outros, de corrupção passiva.
A principal dúvida dos agentes econômicos é se o governo, enfraquecido politicamente, vai ter condições de levar adiante no Congresso Nacional reformas importantes, como a da Previdência, essencial para colocar as contas públicas em ordem.
De forma geral, os especialistas acreditam que a reforma previdenciária vai passar, mas atrasada e ainda mais desidratada do que a versão original do governo, o que acabará deixando para o governo que será eleito no próximo ano ajustar as contas.
“A taxa de juros também foi afetada pela crise política”, acrescentou o economista da consultoria 4E Bruno Lavieri, ressaltando que reduziu a expectativa de crescimento para 2018 a 1,2%, ante de 2%.
Antes da crise política, Lavieri disse que estava em processo de revisão da expectativa para a Selic, acreditando que ela fecharia este ano a 7,5%, mas agora mantém o cenário de 8,25%.
Hoje, a Selic está em 10,25% ao ano após sucessivos cortes feito pelo Banco Central desde outubro passado. Mas, justamente pelo cenário político delicado e incertezas no campo fiscal, o BC já avisou que vai reduzir o ritmo de cortes, mesmo com a inflação cada vez mais fraca e a economia patinando.
A queda dos juros, embora tenha efeito defasado na economia, é considerada fundamental para garantir crescimento de mais longo prazo ao colaborar para reduzir o custo dos empréstimos de empresas e famílias, ajudando na retomada do investimento e consumo.
Dólar e desemprego
A incerteza com o sucesso do governo Temer na área fiscal provocou ainda alta do dólar ante o real diante da maior percepção de risco dos investidores com a economia brasileira.
Desde a delação dos executivos da J&F, o dólar saiu do patamar de R$ 3,10 para o atual de R$ 3,30, o que pode prejudicar a tendência de queda inflação e, consequentemente, obrigar o BC a ser mais duro na condução da política monetária.
“O cenário político mais conturbado deve postergar a tramitação das reformas, dificultando o reequilíbrio fiscal e consequentemente impactando a confiança dos agentes e os preços dos ativos”, afirmou em nota o economista-chefe do banco Itaú Unibanco, Mario Mesquista.
Nas contas dele, o dólar deve ficar em R$ 3,50 no fim de 2017 e R$ 3,60 em 2018, sobre previsão anterior de R$ 3,25 e R$ 3,35. Para o crescimento do PIB, a estimativa agora é de 0,3% este ano e 2,7% em 2018.
Na pesquisa Focus do BC, que ouve semanalmente uma centena de economistas, as previsões antes do estouro da crise eram de que o PIB cresceria 0,5% neste ano e 2,50% em 2018. Agora, as contas caíram a 0,41% em 2017 e, com mais força, a 2,30% no próximo ano.
“Todo esse cenário prejudica bastante o mercado de trabalho. A recuperação (do emprego) que a gente esperava para meados deste ano só deve ocorrer no segundo semestre do ano que vem”, disse Mereb, do Ibre, cuja projeção é de que a taxa de desocupação vai atingir o pico no primeiro trimestre de 2018, a 14,4%. Hoje, ela está em 13,6%.