Como as pequenas e médias indústrias podem colaborar na redução da pobreza e das desigualdades
por: Edson Sadao
A pobreza e as desigualdades (social, de gênero, cultural etc.) são ruins para todos. Elas afetam a eficiência e eficácia das empresas, pois trabalhadores muito pobres e em situação de desigualdade são menos produtivos, recebem baixos salários, consomem pouco e geram um ciclo negativo e vicioso em nossa sociedade. É possível reverter tal situação?
Uma das capacidades que nos distinguem de outros animais é a imaginação, ou seja, vislumbrar algo que ainda não existe. Quem diria, no início do século XVIII, que um objeto mais pesado que o ar poderia voar? Quais brasileiros acreditavam, antes de 1900, que as mulheres iriam votar e serem votadas em nosso país? Quantos enxergavam, na década de 1950, que o homem iria à Lua? Imaginar um Brasil sem pobreza e desigualdade pode gerar sentimentos de descrença e apatia, mas, como podemos mudar sem, ao menos, imaginarmos que isso seja algo possível e desejável?
Para refletirmos sobre como as pequenas e médias indústrias podem contribuir na redução da pobreza e das desigualdades, gostaria de relembrar os ensinamentos de Milton Friedman e Paul Samuelson, prêmios Nobel em economia, sobre o papel das empresas na sociedade. Friedman acreditava que a empresa deveria se concentrar em suas atividades centrais, ou seja, geração de empregos, pagamento de impostos, oferecimento de bons produtos. Aos governos, e apenas ele, caberiam as políticas sociais. Por outro lado, Samuelson defendeu uma visão sistêmica das empresas, ou seja, deveriam contribuir para o entorno. O raciocínio deste economista é a de que a empresa precisa de bons insumos, de mão-de-obra qualificada, de consumidores com emprego e renda, ou seja, o bom desempenho da empresa depende do meio em que se encontra.
Acredito que os economistas se complementam em suas teses. De fato, fazer o básico bem feito nem sempre é simples. Por que cumprir as Leis contribui com a redução da pobreza e das desigualdades? Basta retomar o raciocínio de Milton Friedman. Fazer o que se espera classicamente de uma empresa, muitas vezes, é o suficiente (e o que é possível) na redução da pobreza e desigualdades.
Mas as empresas podem fazer mais e melhor, basta nos inspirarmos em Paul Samuelson. Nesse sentido, vislumbro três opções:
1-As indústrias podem oferecer bolsas (parcial ou integral) de estudos aos funcionários, pois esse tipo de apoio tende a melhorar a produtividade e também contribui na retenção dos melhores talentos. Mas é preciso tomar cuidado, pois o mercado está recheado de opções “baratas”, mas que não atendem aos padrões mínimos de formação. Sugere-se oferecer aos funcionários informações sobre as oportunidades educacionais, as bolsas oferecidas pelo governo ou mesmo firmar convênios com instituições de ensino sérias e com qualidade de ensino. Ou seja, a educação dos funcionários é um investimento com retorno direto para as empresas e também funciona como um mecanismo de redução de pobreza e desigualdade.
2-Além disso, recomendo o apoio, na medida do possível, a ONGs que atuam a favor das pessoas mais pobres e fragilizadas da sociedade. Com know how, com voluntariado, apoiando eventos, ajudando na captação de recursos. Há muitas organizações sérias e que merecem a colaboração das indústrias. Assim como no caso da educação, sugiro contar com o apoio de especialistas para selecionar as melhores ONGs.
3-Em tempos recentes e em função da escassez de recursos provenientes de doações, diversas ONGs têm buscado atividades produtivas e geradoras de recursos, as quais são chamadas de negócios sociais. Aqui, talvez, exista uma via de mão dupla de aprendizados: ao invés das doações clássicas de recursos financeiros, apoiar tecnicamente um negócio social é uma alternativa simples e acessível à maior parte das pequenas e médias indústrias brasileiras e, ao mesmo tempo, pode ser um caminho para aprender maneiras diferentes e inovadoras de se fazer negócios.
Um exemplo de pequena indústria que se configura como negócio social é a Goóc. Trata-se de uma fábrica de mochilas, sandálias e chinelos feitos de material reciclável (lonas e pneus). Por decisão do empresário Thái Quang Nghia, um imigrante Vietnamita, a Goóc tem contratado ex-presidiários e pessoas com mais de 60 anos de idade em sua linha de produção.
Por que a Goóc contribui com a redução da pobreza e desigualdade? Além de pagarem impostos, gerarem emprego e renda e oferecerem um bom produto ao mercado, esta empresa incentiva as atividades de reciclagem as quais tendem a beneficiar pessoas mais pobres que atuam em sua cadeia; ao contratar pessoas que estão, em geral, à margem da sociedade, contribui com a redução de pobreza e desigualdade social. Nem sempre outras indústrias podem adotar algo semelhante à Goóc, mas por que não se inspirar nesta empresa na construção de uma sociedade brasileira mais justa, humana e menos desigual?
Faço um convite a que todos os que querem contribuir para um Brasil economicamente forte, socialmente justo e ambientalmente correto possam aperfeiçoar suas atividades e incorporarem ações e atividades simples ao seu alcance para o bem de todos nós.
- O autor é Graduado (1996), Mestre (2003) e Doutor (2008) em Administração Pública e Governo pela EAESP-FGV. Especialista em Liderança para o Terceiro Setor (1999) e foi trainee GIFE (programa apoiado pela Fundação Kellogg).